segunda-feira, 16 de abril de 2012

Quando o rosto do outro muda

Nestes últimos dias tive oportunidade de aprofundar meus conhecimentos em um pensador e filósofo contemporâneo chamado Emmanuel Levinas. Alguns conceitos importantes podem destacar a obra deste estudioso, como “o outro” e seu “rosto”. O outro que Levinas conceitua diz respeito ao universo infinito e intocável que temos diante de nós quando contemplamos o ser humano em sua forma autentica. Por exemplo, quando você olha sua esposa, seu marido, filho ou seus pais e amigos, você está vendo uma fração deste outro em sua individualidade rica e dinâmica. Simplifiquei aqui o conceito de “outro”. Caso o outro olhe pra você e convide você a fazer parte de seu mundo, ao entrar em seu convívio, convida-o a estender sua mão a ele e ampliar seu conhecimento a respeito deste mesmo que o convida. Este convite é feito através de seu “rosto”. O rosto é como o outro se mostra a nós, e como nós mesmos também nos mostramos ao outro. Muito bem, e o que muda a partir disto? É aí que a filosofia clínica nos auxilia a relacionar conceitos importantes como os de “rosto e o outro” com o nosso dia a dia. Pensando a respeito, lembrei de um fato que me ocorreu em uma empresa onde trabalhei alguns anos a atrás. Na oportunidade tinha assumido um cargo de liderança, e estava empenhado em formar uma boa equipe de trabalho, capacitar meus liderados e é claro, corresponder às expectativas da empresa que havia me dado àquela oportunidade. Acreditava, e continuo acreditando, que para uma equipe alcançar resultados permanentes, precisamos desenvolver as pessoas envolvendo-as nas decisões, fazendo-as se sentir parte do trabalho, e fundamentalmente tratando-as com respeito. Tal foi minha surpresa quando percebi que o conceito de “respeito” que procurava ter pelas pessoas da equipe, seu significado foi confundido por uma delas com o de “bondade”, na minha visão talvez de “condescendência”. Provavelmente esta pessoa julgou que poderia fazer seu próprio horário, portar-se como lhe conviesse, cumprir as atividades no prazo que quisesse. Talvez pela minha forma de trabalhar, ela acreditava que acima de tudo, eu iria “respeitá-la”. Na verdade a situação me incomodava porque pela minha percepção ela estava aproveitando-se da situação. Chamei-a algumas vezes para conversar, procurei entender o que estava acontecendo, manifestei meu aborrecimento com as atitudes e os fatos que presenciava na relação dela comigo e com a equipe. Infrutífero! Certo dia precisei tomar a decisão que já me era inevitável: Demitir aquele profissional. Naquela oportunidade, ouvi: “...é... um dia as pessoas sempre mostram a sua verdadeira cara...” Aqui vêm à relação que podemos fazer do rosto e do outro que Levinas nos ensina. Supostamente para o profissional demitido, o rosto que eu mostrei no início de nosso trabalho juntos mudou, pois tinha tomado uma decisão que lhe foi dura e naquele instante o prejudicou. Se eu fosse questionado lá naquele dia, diria que o rosto dele é que mudou, que tinha se mostrado um bom funcionário, depois quis se aproveitar de alguma forma das circunstancias em benefício próprio. Hoje, refletindo sobre este ocorrido, penso que nem eu e nem ele mudamos o rosto. Provavelmente o que encontramos foi um pouco do “outro” que também realmente existia dentro de nós. Quando isso ocorre, uma reação comum para alguns é de surpresa, para outros, motivo de mágoa ou decepção e por vezes de rupturas de relacionamentos, de amizades. Por vezes, a convivência intensa e a intimidade nos relacionamentos proporcionam diversas oportunidades de conhecermos as pessoas que nos cercam, porém muitos têm o hábito de achar que as pessoas são aquilo que elas nos mostram. Pode ser que algumas pessoas se mostrem para nós, durante algum tempo, da forma como entende que gostaríamos que elas fossem, não como realmente são. Podem fazer isto por muitos motivos: por carinho e amor, por admirar alguém e projetar a si mesmo nela, ou ainda por medo de serem rejeitadas. Algumas até por interesse próprio e outras por nenhum motivo proposital ou lógico, entre tantos outros. É sábio entender que muitos de nós também funciona assim com os outros. Quantas vezes olhamos para as pessoas em nossa volta e achamos que são elas que mudaram conosco. O amigo que nos esqueceu, o patrão que parece ter nos eleito para “pegar no pé”, a filha ou filho que não nos liga, enfim, o rosto do outro mudou. Será?! Talvez estejamos entrando em contato com parte daquilo que o outro também é, e não estamos gostando do que estamos descobrindo, porque suas opiniões podem ser diferentes e não conseguimos lidar com as diferentes opiniões?! Ou ainda posso pensar: Talvez, será que a mudança não ocorreu em mim e o que percebo é a reação das pessoas a minha mudança? Para adentrar neste terreno rico da auto descoberta e da descoberta do outro, no meu ponto de vista, precisamos exercitar a humildade e o diálogo. Para Levinas isto é tratar o outro como Sagrado. Agir com humildade procurando entendê-lo, e neste processo de abertura, estar preparado para se descobrir também. Para mim, vale a pena tentar.Por Andre Topanotti

Um comentário:

Andre Topanotti disse...

Aloysio

Obrigado por prestigiar o artigo.
Você também está na lista de quem sigo.

Sigamos juntos.

Forte abraço!

André Topanotti