segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

ANO NOVO

O ano novo, réveillon, virada de ano ou passagem de ano é um evento que ocorre quando uma cultura celebra o fim de um ano e o começo de um próximo. 

Todas as culturas que tem um calendário anual, celebram o ano novo. 

O termo “reveillon”, que é a celebração do encerramento do ano atual e boas vindas ao ano novo, vem da palavra “réveiller” que significa “despertar”. 

No ocidente a comemoração tem origem em um decreto do governador romano Júlio César, que fixou o dia primeiro de janeiro como o dia do ano novo, isto 

em 46 da era comum. O romanos dedicavam este dia a Jano, o deus dos portões. O mês de janeiro deriva de Jano, que tinha duas faces, uma voltada para frente 

visualizando o futuro e a outra voltada para trás, visualizando o passado. 

Atualmente a passagem do ano, celebrada em todo o mundo e, normalmente, envolve queima de fogos de artifício em festas públicas, reuniões familiares, com amigos 

ou ceias festivas e diferentes tipos de promessas e simpatias. 

Em algumas grandes cidades existem comemorações especiais com grande queima de fogos de artifício, chegando a se tornarem grandes eventos turisticos, como ocorre 

anualmente na cidade do Rio de Janeiro e Nova York. 

Brindemos a chegada de 2013. Por: Aloysio Tiscoski

quinta-feira, 27 de dezembro de 2012

O MUNDO NÃO ACABOU

Pode ser que o mundo acabe entre hoje (segunda, dia em que escrevo) e quinta, 27, dia em que seria publicada esta coluna. Em tese, eu não devo me preocupar: meu título não será desmentido --pois, se o mundo acabar, não haverá mais ninguém para verificar que eu me enganei.

Tudo isso, em termos, pois o fim do mundo esperado (mais ou menos ansiosamente) por alguns (ou por muitos) não é o sumiço definitivo e completo da espécie. Ao contrário: em geral, quem fantasia com o fim do mundo se vê como um dos sobreviventes e, imaginando as dificuldades no mundo destruído, aparelha-se para isso.

Na cultura dos EUA, os "survivalists" são também "preppers": ou seja, quem planeja sobreviver se prepara. A catástrofe iminente pode ser mais uma "merecida" vingança divina contra Sodoma e Gomorra, a realização de uma antiga profecia, a consequência de uma guerra (nuclear, química ou biológica), o efeito do aquecimento global ou, enfim (última moda), o resultado de uma crise financeira que levaria todos à ruina e à fome.

A preparação dos sobreviventes pode incluir ou não o deslocamento para lugares mais seguros (abrigos debaixo da terra, picos de montanhas que, por alguma razão, serão poupados, lugares "místicos" com proteção divina, plataformas de encontro com extraterrestres etc.), mas dificilmente dispensa a acumulação de bens básicos de subsistência (alimentos, água, remédios, combustíveis, geradores, baterias) e (pelo seu bem, não se esqueça disso) de armas de todo tipo (caça e defesa) com uma quantidade descomunal de munições -sem contar coletes a prova de balas e explosivos.

Imaginemos que você esteja a fim de perguntar "armas para o quê?". Afinal, você diria, talvez a gente precise de armas de caça, pois o supermercado da esquina estará fechado. Mas por que as armas para defesa? Se houver mesmo uma catástrofe, ela não poderia nos levar a descobrir novas formas de solidariedade entre os que sobraram? Pois bem, se você coloca esse tipo de perguntas, é que você não fantasia com o fim do mundo.

Para entender no que consiste a fantasia do fim do mundo, não é preciso comparar os diferentes futuros pós-catastróficos possíveis. Assim como não é preciso considerar se, por exemplo, nos vários cenários desolados do dia depois, há ou não o encontro com um Adão ou uma Eva com quem recomeçar a espécie. Pois essas são apenas variações, enquanto a necessidade das armas (e não só para caçar os últimos coelhos e faisões) é uma constante, que revela qual é o sonho central na expectativa do fim do mundo.

Em todos os fins do mundo que povoam os devaneios modernos, alguns ou muitos sobrevivem (entre eles, obviamente, o sonhador), mas o que sempre sucumbe é a ordem social. A catástrofe, seja ela qual for, serve para garantir que não haverá mais Estado, condado, município, lei, polícia, nação ou condomínio. Nenhum tipo de coletividade instituída sobreviverá ao fim do mundo. Nele (e graças a ele) perderá sua força e seu valor qualquer obrigação que emane da coletividade e, em geral, dos outros: seremos, como nunca fomos, indivíduos, dependendo unicamente de nós mesmos.

Esse é o desejo dos sonhos do fim do mundo: o fim de qualquer primazia da vida coletiva sobre nossas escolhas particulares. O que nos parece justo, no nosso foro íntimo, sempre tentará prevalecer sobre o que, em outros tempos, teria sido ou não conforme à lei.

Por isso, depois do fim do mundo, a gente se relacionará sem mediações --sem juízes, sem padres, sem sábios, sem pais, sem autoridade reconhecida: nós nos encararemos, no amor e no ódio, com uma mão sempre pronta em cima do coldre.

E não é preciso desejar explicitamente o fim do mundo para sentir seu charme. A confrontação direta entre indivíduos talvez seja a situação dramática preferida pelas narrativas que nos fazem sonhar: a dura história do pioneiro, do soldado, do policial ou do criminoso, vagando num território em que nada (além de sua consciência) pode lhes servir de guia e onde nada se impõe a não ser pela força.

Na coluna passada, comentei o caso do jovem que matou a mãe e massacrou 20 crianças e seis adultos numa escola primária de Newtown, Connecticut. Pois bem, a mãe era uma "survivalist"; ela se preparava para o fim do mundo. Talvez, junto com as armas e as munições acumuladas, ela tenha transmitido ao filho alguma versão de seu devaneio de fim do mundo. Por: Contardo Calligaris  Folha de SP


quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

DESEJOS!

Desejo é algo que quero para mim ou quero para o outro. Segundo um dos grandes autores da Filosofia, Arthur Shopenhauer, o ato de desejar é o pilar da existência humana. Para ele, o homem só vive porque deseja,está em movimento porque quer sair de onde está e quer chegar em outro lugar. Para muitas pessoas realmente as coisas são assim, elas só passam de um verão para um outono porque desejam algo que está no outono. Passar de um momento a outro da existência com base nos desejos, no querer, é algo presente na vida de muitas pessoas.


Em Filosofia Clínica, o desejo é parte do tópico chamado buscas. Neste tópico encontramos todo o conteúdo relacionado aos direcionamentos existenciais da pessoa. Cada um ao longo da vida se orienta ou é orientado na medida em que vive de onde pode, quer ou deve chegar. Esse movimento de deslocamento entre um ponto e outro boa parte das vezes é um hiato, um espaço vazio, a pessoa caminha mas não sabe como, não percebe, só percebe que caminha na medida em que se aproxima ou se afasta daquilo que deseja. Quando algumas dessas pessoas param e pensam um pouco sobre o modo como estão caminhando se perguntam se realmente vale o esforço. 

Há algumas pessoas que quando param e avaliam seus objetivos e olham para a sua caminhada se perguntam se não seria possível caminhar diferente. Para estas pessoas, caminhar diferente pode ser ir mais devagar, ir com mais cuidados, com mais planejamento, quem sabe com mais gente. Para muitos é impensável dividir o fardo, porque provavelmente também não dividiriam os louros da vitória de um objetivo conquistado. Avaliar como se caminha, até onde se quer chegar e se é possível chegar, pode ser uma ao alternativa para esta época do ano.

Muitos já estão dormentes, estão tão agendados de objetivos que não tem a ver consigo que sequer sabem para onde estão caminhando. São pessoas que passaram o ano como o cachorro, correndo atrás do próprio rabo, e que agora, ao final de mais um ano, não sabem onde conseguiram chegar. Esse movimento que forma um círculo vicioso e que não leva a lugar algum é um movimento ao qual Sísifo foi condenado pela eternidade. É justamente a atitude de repetir sempre a mesma atividade sem ver utilidade nenhuma nela que faz com que ela seja tão sofrida. É claro que esta é a tradução feita de acordo com Sísifo. 

Os desejos que muitos colocam como pontos aonde chegar no ano que se inicia pode ser aquilo que faltava para uma vida de acordo consigo mesmos. Para outros, no entanto, o que desejam por vezes os encaminhará para ainda mais longe de si. Veja sua própria caminhada e onde está ao longo dela, se está perto ou longe de si mesmo. O meu voto é que aquilo que você deseja se cumpra na medida em que lhe for proveitoso, que seja bom a você mesmo e aos seus. Que o ano de 2013 seja o tempo de realizar os pequenos sonhos, desejos, buscas, compromissos que ficaram de uma vida toda. Lembre-se de que para fazer a vida ser diferente às vezes é preciso que façamos diferente.
Por: Rosemiro Sefstrom

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

O HUMANISMO DE DEUS DA CARNIFICINA

Hoje é véspera de Natal. Noite feliz. Proponho como espiritualidade natalina a hipótese do filme "Deus da Carnificina", de Roman Polanski. O filme é uma peça de teatro, uma prova perfeita de que menos é mais.

O elenco arrasa: Jodie Foster (a chata politicamente correta azeda), Kate Winslet (a gostosa reprimida e histérica que vomita quando fica nervosa e se ressente da ausência do marido que não larga o celular), Christoph Waltz (advogado cínico de uma indústria farmacêutica, marido da Winslet) e John C. Reilly (marido da Foster, aparentemente pacífico e submisso a ela, com medo de hamsters, mas que estoura no fim e a acusa de ser moralista e "fake").

Dois casais se encontram na casa de um deles (Foster e Reilly) para conversar sobre a porrada na cara que o filho deles recebeu do filho do outro casal (Winslet e Waltz).

O que de início parece ser uma conversa civilizada entre pessoas que têm um conflito para resolver num "espírito Obama de ser", do tipo "a guerra do Oriente Médio pode ser resolvida com um ciclo de filmes chatos sobre a paz", acaba por se transformar num desentendimento geral em que as verdadeiras e sombrias personalidades e vergonhas aparecem.

Exceção feita ao advogado que, desde cedo, revela sua impaciência com o blá-blá-blá do amor à África da personagem da Foster e sua ideia de que nós ocidentais de fato superamos nossas misérias em favor de uma sociedade com "consciência social". Consciência social é sempre tão falsa como bolsa Prada "fake", ou se não é falsa, você é um puritano fanático que baba sangue na mesa.

Ela escreve livros sobre Darfur e a miséria na África e, em meio a seus berros contidos de histérica, ela decreta que quem não se preocupa com a pobreza mundial não tem caráter. Tenta passar a imagem de que ama e perdoa a todos, inclusive o filho da Winslet que bateu em seu filho, mas no fundo é uma passiva agressiva, aquele tipo de mulher descrita por Woody Allen, que fala baixinho, mas fere fundo com sua saliva venenosa e cruel.

Outro traço risível da personagem da Foster é seu "amor à cultura". Quando Winslet vomita em seus livros de arte (aquele tipo de livro-trambolho de arte que a classe média "semiletrada", termo usado pelo crítico Otto Maria Carpeaux, deixa em sua mesa de centro como atestado de sua ilustração afetada), Foster começa a gritar e fala como eles procuram dar aos filhos uma educação "cultural" para fazer deles pessoas melhores.

Risadas? Se não bastasse o clichê dos nazistas que choravam com Bach à noite e torravam judeus de dia, qualquer pessoa inteligente e não afetada por essa falácia de que a cultura deixa alguém melhor sabe do ridículo dessa hipótese pedagógica.

Foster é aquele tipo de mãe que acha que seus filhos ficam nas redes sociais discutindo a fome em Zâmbia, quando na realidade estão fazendo bullying em rede com algum colega feio da escola.

O conflito central do enredo se dá entre esse novo puritanismo "fake" que assola o mundo contemporâneo de gente chiquezinha de Nova York e São Paulo (gente que fala frases do tipo "Nova York é outra coisa"), representada por Jodie Foster, e o cinismo niilista do advogado interpretado por Waltz.

A hipótese do advogado, que dá nome ao filme (em inglês "Carnage", que é carnificina), é de que talvez exista um Deus, mas ele é mal e gosta de nos ver nos matando, daí a carnificina. Em oposição ao besteirol da África vítima, ele narra suas viagens à África, nas quais vê como eles se matam entre si com prazer, cortando-se mutuamente em pedaços. E Deus se diverte com isso.

Essa hipótese é conhecida por todo estudioso do cristianismo antigo: alguns textos antigos falam de um Deus mau, o Deus dos gnósticos.

Ele seria um sádico e nos criou para nos torturar. Essa hipótese, com diferenças locais, aparece em heréticos como os bogomilos e cátaros na Idade Média, em Sade no século 18, em Cioran no 20 e em Lars von Trier na sua releitura do Éden, no "Anticristo".

Eu prefiro o niilismo do advogado Waltz ao amor "político" da Foster. Escolho a dor, e não a mentira, porque sou um humanista. Por: Luiz Felipe Pondé Folha de SP

domingo, 23 de dezembro de 2012

NATAL...

Natal... Na província neva.
Nos lares aconchegados,
Um sentimento conserva
Os sentimentos passados.


Coração oposto ao mundo,
Como a família é verdade!
Meu pensamento é profundo,
'Stou só e sonho saudade.


E como é branca de graça
A paisagem que não sei,
Vista de trás da vidraça
Do lar que nunca terei!


Fernando Pessoa

sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

NATAL

Para isso fomos feitos:

Para lembrar e ser lembrados
Para chorar e fazer chorar
Para enterrar os nossos mortos —
Por isso temos braços longos para os adeuses
Mãos para colher o que foi dado
Dedos para cavar a terra.
Assim será nossa vida:
Uma tarde sempre a esquecer
Uma estrela a se apagar na treva
Um caminho entre dois túmulos —
Por isso precisamos velar
Falar baixo, pisar leve, ver
A noite dormir em silêncio.
Não há muito o que dizer:
Uma canção sobre um berço
Um verso, talvez de amor
Uma prece por quem se vai —
Mas que essa hora não esqueça
E por ela os nossos corações
Se deixem, graves e simples.
Pois para isso fomos feitos:
Para a esperança no milagre
Para a participação da poesia
Para ver a face da morte —
De repente nunca mais esperaremos...
Hoje a noite é jovem; da morte, apenas
Nascemos, imensamente.
Por: Vinicius de Moraes


quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

TABACARIA

Não sou nada. 
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.

Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.

Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.

Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.

Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar?

Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou?
Ser o que penso? Mas penso tanta coisa!
E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos!

Gênio? Neste momento
Cem mil cérebros se concebem em sonho gênios como eu,
E a história não marcará, quem sabe?, nem um,
Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras.
Não, não creio em mim.
Em todos os manicômios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?
Não, nem em mim...

Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo
Não estão nesta hora gênios-para-si-mesmos sonhando?
Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas -
Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -,
E quem sabe se realizáveis,
Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente?
O mundo é para quem nasce para o conquistar
E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão.
Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez.
Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo,
Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu.
Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda,
Ainda que não more nela;

Serei sempre o que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta,
E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira,
E ouviu a voz de Deus num poço tapado.
Crer em mim? Não, nem em nada.
Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente
O seu sol, a sua chama, o vento que me acha o cabelo,
E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Escravos cardíacos das estrelas,
Conquistamos todo o mundo antes de nos levantar da cama;
Mas acordamos e ele é opaco,
Levantamo-nos e ele é alheio,
Saímos de casa e ele é a terra inteira,
Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido.

(Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.)

Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei
A caligrafia rápida destes versos,
Pórtico partido para o Impossível.
Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas,
Nobre ao menos no gesto largo com que atiro
A roupa suja que sou, em rol, pra o decurso das coisas,
E fico em casa sem camisa.

(Tu que consolas, que não existes e por isso consolas,
Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva,
Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta,
Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida,
Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua,
Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais,
Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -
Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire!

Meu coração é um balde despejado.
Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco
A mim mesmo e não encontro nada.
Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta.
Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam,
Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam,
Vejo os cães que também existem,
E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo,
E tudo isto é estrangeiro, como tudo.)

Vivi, estudei, amei e até cri,
E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu.
Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira,
E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses
(Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso);
Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo
E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente.

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a máscara,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.
Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado.
Deitei fora a máscara e dormi no vestiário
Como um cão tolerado pela gerência
Por ser inofensivo
E vou escrever esta história para provar que sou sublime.

Essência musical dos meus versos inúteis,
Quem me dera encontrar-me como coisa que eu fizesse,
E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte,
Calcando aos pés a consciência de estar existindo,
Como um tapete em que um bêbado tropeça
Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada.

Mas o Dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta.
Olho-o com o deconforto da cabeça mal voltada
E com o desconforto da alma mal-entendendo.
Ele morrerá e eu morrerei.
Ele deixará a tabuleta, eu deixarei os versos.
A certa altura morrerá a tabuleta também, os versos também.
Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta,
E a língua em que foram escritos os versos.
Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu.
Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente
Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas,

Sempre uma coisa defronte da outra,
Sempre uma coisa tão inútil como a outra,
Sempre o impossível tão estúpido como o real,
Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície,
Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra.

Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?)
E a realidade plausível cai de repente em cima de mim.
Semiergo-me enérgico, convencido, humano,
E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário.
Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los
E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.
Sigo o fumo como uma rota própria,
E gozo, num momento sensitivo e competente,
A libertação de todas as especulações
E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto.
Depois deito-me para trás na cadeira
E continuo fumando
. Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando.

(Se eu casasse com a filha da minha lavadeira
Talvez fosse feliz.)
Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela.
O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?).
Ah, conheço-o; é o Esteves sem metafísica.
(O Dono da Tabacaria chegou à porta.)
Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me.
Acenou-me adeus, gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo
Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o Dono da Tabacaria sorriu.

Álvaro de Campos, 15-1-1928

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

BRANCA DE NEVE AZEDA

Fazer a cabeça das crianças sempre foi um dos pratos prediletos do fascismo. Agora, nem a Branca de Neve escapa, coitada, do ódio dos fascistas. O conjunto de "estudos" que se dedica a fazer a cabeça das crianças é parte do que podemos chamar de "oppression studies".


Você não sabe o que é?

"Oppression studies" é uma expressão usada pelo jornalista americano Billy O'Reilly, da Fox News, para se referir às "ciências humanas engajadas no controle das mentes". Explico.

Reprovou um aluno? Opressão. É preguiçoso? Não, a sociedade te oprimiu e fez você ficar assim. Um ladrão te assaltou? Ele é o oprimido, você o opressor. Aliás, sobre isso, vale dizer que, com a violência em São Paulo, devemos reescrever a famosa frase do Che: "Hay que enfiar la faca em la cavera, pero sin perder la ternura jamás".

A frase dele, assinatura de camisetas revolucionárias, é: "Hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás". Essa camiseta é a verdadeira arma contra gente como ele. Os americanos deveriam afogar o Irã em Coca-Colas, Big Macs e pílulas anticoncepcionais para as iranianas transarem adoidado com seus amantes.

Convidou uma colega de trabalho para jantar? Opressão! Você é um opressor por excelência, deveria ter vergonha disso. Não é um amante espiritual do Obama? Opressor! Come picanha? Opressor! Não acha que a África é pobre por culpa sua? Opressor! Suspeita de que o sistema de cotas vai destruir a universidade pública criando um novo espaço de corrupção via reserva tribal de mercado e compra de diplomas de escolas públicas? Se você suspeita disso, é um opressor! Acha que uma pessoa deve ser julgada pelos seus méritos e não pelo que o tataravô do vizinho fez? Opressor! Anda de carro? Opressor! Ganhou dinheiro porque trabalha mais do que os outros? Opressor!

Os "oppression studies" sonham em fazer leis. Por exemplo, recentemente, um comitê de gênero (isto é, o povo que diz que sexo não existe e que tudo é uma "construção social", claro, opressora) desses países em que o "mundo é perfeito" teve uma nova ideia.

Esses caras (ou seriam car@s?) querem proibir qualquer propaganda ou programação infantil que reproduza imagens de mulher sendo mulher e homem sendo homem. Não entendeu? É meio confuso mesmo. Vamos lá.

Imagine uma propaganda na qual existe uma família. Segundo os especialistas em "oppression studies", para a marca não ser opressora, a família não pode ser heterossexual, porque se assim o for, o "espelho social" (a imagem que a mídia reproduz de algo) fará os não heterossexuais se sentirem oprimidos.

O problema aqui não é que as pessoas devem ser isso ou aquilo (melhor esclarecer, se não eu viro objeto de estudo dos "oppression studies"), mas sim por qual razão esses cem car@s (não são muito mais do que isso), que não têm o que fazer na vida a não ser se meter na vida, na família e na escola dos outros, têm o direito de dizer o que meus filhos ou os seus devem ver na TV? Até quando vamos aturar essa invasão da vida alheia em nome dos "oppression studies"?

Contos de fadas como Branca de Neve, Cinderela e Gata Borralheira são grandes objetos de atenção dos "oppression studies". Claro, as três são oprimidas, por isso gostam dos príncipes. Se fossem livres, a Branca de Neve pegaria a Cinderela. Humm... não seria uma má ideia....

Veja o lixo que ficou a releitura da Branca de Neve no filme que tem a atriz da série "Crepúsculo", a bela Kristen Stewart, como a Branca de Neve. Coitada...

A coitada tem que terminar sozinha para sustentar sua posição de rainha "empoderada", apesar de amar o caçador (passo essencial para libertar nossa heroína da opressão de amar alguém da nobreza, o que seria ainda mais opressor).

Os "oppression studies", na sua face feminista, revelam aqui o ridículo de sua intenção: fazer de toda mulher uma mulher sem homem porque ela mesma é o homem. Todo mundo sabe que isto é a prova mais banal da chamada inveja do falo da qual falam os freudianos. Fizeram da pobre Branca de Neve uma futura rainha velha e sem homem. Ficará azeda como todas que envelhecem assim. Por: Luiz Felipe Pondé Folha de SP

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O DEVANEIO É UMA DOENÇA

Cansada de sonhar de olhos abertos, uma leitora, Ana, quer saber mais sobre devaneios: "Por que acabo sempre fugindo para esse lugar fictício, onde tudo pode ser tão melhor ou pior, um mundo do que poderia ser, do que poderia ter sido, da pior hipótese fantástica, pretéritos imperfeitos, mais que perfeitos, futuros incertos -e quando vejo, perdi tanto tempo com isso?".


Tenho carinho pelos sonhos de olhos abertos. Até o começo da adolescência, o devaneio era meu aliado contra o que me parecia ser a mediocridade do mundo.

Para mim, como para Ana, o devaneio era o país de onde eu vinha (minha origem escondida) ou minha pátria futura; de um jeito ou de outro, era meu passaporte para um outro mundo, que me salvaria de meu lugar e de meu presente.

Graças ao devaneio, assisti a centenas de aulas chatérrimas aparentando minha absoluta atenção (embora de olhos um tanto vidrados). Quando atravessei a dolorosa época em que os adolescentes menosprezam os seus pais, o devaneio me consolou, alimentando a certeza de que eu, de fato, pertencia a outra família.

Enfim, à força de contar histórias para mim mesmo, aprendi a contá-las para os outros.

O que fez com que, aos poucos, meu devaneio se acalmasse (por sorte, sem se exaurir)? Será que eu "amadureci"? Ou será que as aulas, o trabalho e os amores se tornaram interessantes, e a necessidade de sonhar diminuiu?

Na hora de explicar o excesso de devaneio, o adolescente tende a acusar a realidade na qual ele vive, a qual mereceria o enfado que ela lhe inspira.

Mas, em geral, não há realidade enfadonha, apenas indivíduos enfadados, que, por alguma razão, não enxergam o encanto possível do dia a dia.

Ao devanear, eu me afasto da realidade. Por outro lado, sem devanear, mal consigo inventar e desejar realidades diferentes. O que é pior? Entre renunciar a devanear e sucumbir ao devaneio, talvez seja pior renunciar a devanear.

Infelizmente, enquanto a gente sonha sossegado, alguns se esforçam para transformar o devaneio num transtorno, se não numa doença. Desde um texto de 2002 no "Journal of Contemporary Psychotherapy" (revista de psicoterapia contemporânea, http://migre.me/cjDUi), monitoro a ascensão do
"transtorno" de devaneio excessivo e "mal-adaptativo" (ao mesmo tempo, desadaptado e capaz de comprometer nossa adaptação ao mundo).

Rapidamente, os blogs se multiplicaram -tanto de pessoas se queixando de seus devaneios excessivos como de médicos interessados em registrar o novo transtorno e propor uma cura. Dez anos atrás, o devaneio era considerado como fuga de um provável abuso infantil. Hoje, é possível ser sonhador sem ter sido abusado; é um alívio.

No fim de 2011, foi publicada, em "Consciousness and Cognition" (consciência e conhecimento), uma pesquisa detalhando o sofrimento dos sonhadores compulsivos (http://migre.me/ciyPG): blogs e sites fizeram uma festa.

Aprendemos que os sonhadores de olhos abertos sentem vergonha de sua condição. Eles se escondem, mas podem ser identificados porque, sem se dar conta, enquanto sonham, eles atuam seus devaneios em gestos e palavras (ou seja, falam sozinhos). Enfim, eles precisam ser ajudados porque tudo isso leva a ansiedade e depressão.

Li recentemente, num blog, a carta de uma mãe preocupada porque o filho, de sete anos, não para de sonhar em proteger o mundo contra os malvados ou em distribuir dinheiro aos pobres. Será que, nas próximas décadas, o devaneio ocupará o lugar do transtorno de deficit
de atenção?

Desde 2008 (http://migre.me/ciyZL), alguns garantem que a fluvoxamina (remédio, em tese, para transtornos obsessivo-compulsivos) cortaria o devaneio excessivo. Se os laboratórios decidirem que medicar o devaneio é um bom negócio, que Deus acuda as crianças.

O devaneio excessivo é o hábito de Dom Quixote, Madame Bovary, dois terços dos adolescentes, quase todos os autores de novelas e romances etc.

Transformar esse hábito, tão humano, em "transtorno", é uma tentativa de regular nossas vidas com a desculpa higienista: tudo nos é imposto para nossa "saúde" e nosso bem. Pararemos de sonhar porque é mais "saudável" prestar atenção só no que está na agenda de hoje?

No fundo, nada disso me estranha. Desde o século 19, as regras para uma vida saudável (física e psíquica) são nossa nova moral. E esse ataque contra o devaneio era previsível: qualquer forma de poder prefere limitar os sonhos de seus sujeitos.
Por: Contardo Calligaris  Folha de SP

sábado, 15 de dezembro de 2012

30 RAZÕES PARA NÃO TRAIR SUA ESPOSA


Alguns homens precisam de somente uma razão, mas aqui temos trinta: 

1 -  A estatística de que 80% dos homens traem as suas mulheres é uma lenda urbana. Provavelmente espalhada pelos homens que traem. Não acreditem. 

2 - A estatística mais correta é 40%, que embora pareça ser muito elevada mostra que a maioria dos homens casados é fiel, 60%. 

3 -  E mesmo estes 40% não espelham exatamente a realidade. As pesquisas perguntam "Você já traiu a sua mulher? " Mas não perguntam quantas vezes. 

Quando se pergunta, descobre-se que 75% traíram suas mulheres de fato, mas foi uma única vez. Traidores contumazes são somente 10%. 

4 - Quando um homem trai uma única vez, ele não se exime do rótulo de "traidor", mas há uma enorme diferença. Ele está demonstrando, para si e para os homens que estão lendo este texto, que a experiência não foi tão fantástica assim, que não foi nada do que os amigos e a mídia disseram que seria. 

5 - Ou seja, 70% dos homens que traem o fazem uma única vez e se arrependem, ou pelo menos não voltaram a trair. 

6 -  Muitos homens (e mulheres) traem porque deixaram outros problemas do casal se acumularem. Se você não consegue resolver seus problemas à medida que eles ocorrem, segredo número um de um casamento, criar um outro problema não será a solução. 

7 -  A razão que 70% acha que a aventura foi decepcionante, é que sua mulher aprende ao longo dos tempos a mexer nos botões exatos e no momento certo para deixá-lo nas nuvens, e eu você, vice versa. A mulher que o conhece numa única noite não saberia nem por onde começar, e vice versa, e a experiência será uma decepção. 

8 -  Hoje, as mulheres traídas não deixam barato, e além da fama de traidor provavelmente você acabará a sua vida também com a fama de corno. 

9 -  Das mulheres que traem os seus maridos, 70% os traem na semana da ovulação. Enquanto você trai com camisinhas, elas traem para engravidar. Portanto, pelo menos não traia a sua esposa na semana que ela está ovulando. 

10 -  Dez por cento das mulheres têm um filho que não é exatamente do marido. Ou seja, 30% das mulheres que têm 3 filhos, um deles não é do marido. É muito alta esta estatística. Pior, se 30% conseguiu ter um filho de um homen mais lindo do que você, eu diria que pelo menos 50% tentaram mas não conseguiram. Você gastaria melhor o seu tempo vigiando a sua esposa, do que desparecendo por aí sem dar satisfação. 

11 -  Trair sua mulher uma única vez e ficar arrependido para o resto da vida não compensa, a não ser que seja a Cameron Dias, que infelizmente não está nem aí por você. 

12 -  Se você é um traidor serial, saiba que mais dia menos dia, sua esposa descobrirá. 

13 -  Se o Diretor Geral da CIA não conseguiu manter segredo, imagine você. 

14 -  Sempre haverá alguém que sabe de tudo, sua própria amante, e é ela quem irá te entregar. Foi a Monica Levinsky que contou para todo mundo, não o Bill Clinton. 

15 -  Achar que trair com uma mulher casada é mais seguro, é outra lenda urbana. Mais dia menos dia, numa briga de casal, ela dirá para o seu marido. "Seu amigo x, inclua aqui seu nome, transa muito melhor do que você". Eu, heim! 

16 -  Achar que sua amante é fiel a você é outra ingenuidade. Você já conhece o caso do Presidente da República do Brasil que adotou o filho seu com a amante, para depois descobrir que não era seu. Será sempre lembrado por isto, você vai querer o mesmo? 

17 -  Você pode driblar a sua esposa, mas não seus amigos, os filhos de seus amigos, que mais dia menos dia verão você com quem não deviam. 

18 -  Pior do que a sua esposa ficar sabendo, é a sua filha. Ao contrário da mãe, elas nunca perdoam. Repito, nunca perdoam. 

19 -  Pense no ex-Presidente Bill Clinton, e diga qual é a primeira ideia que vem à sua mente. Não foi que ele equilibrou pela primeira vez em 300 anos o orçamento americano, mas o que teve um caso com uma estagiária. 

20 -  Tem muita mulher jovem e solteira por aí que não quer casar, só quer seu filho e uma pensão alimentícia para o resto da vida. Pode te custar muito caro. 

21 -  Quando casamos prometemos que não queríamos um casamento onde reinasse o ciúme, ou a preocupação de que alguém chegou tarde porque estava com um caso num motel. Fidelidade é recíproca. 

22 -  Quando traidores contumazes são pegos, eles enviam declarações à imprensa como estão arrependidos, pedem desculpas e perdão às famílias e filhos pelo constrangimento da situação. Honestamente, isto vale a pena em troca de 10 noites mal transadas num motel? 

23 -  Estes garanhões vão provavelmente conviver com uma esposa, puta da vida para o resto da vida, que vai lhe castrar para o resto da vida, lembrando do fato a cada nova discussão. Pergunte para o Bill Clinton como é viver agora com a Hillary Clinton, e ao Dominique Kahn. Hoje são cordeirinhos de dar dó. 

24 -  Ser fiel no casamento não significa ser fiel antes do casamento, antes de conhecer a sua alma gêmea. Este é o período de farra, de mostrar que você é um garanhão e tanto. Cada fase da vida tem o seu calor e seu desfecho. Sair aos 50 fazendo o que você fazia aos 30 é sinal de insegurança, imaturidade, e simplesmente ridículo. 

25 -  Você escolheu sua mulher porque ela era a melhor mulher disponível, mesmo sabendo que estatisticamente outras mais fantásticas iriam eventualmente surgir na sua vida. Ela fez o mesmo, por isto vocês prometeram ser fiéis, apesar das beldades e garanhões que ambos iriam conhecer no futuro. 

26 -  Seus filhos lhe deram muito trabalho e muita alegria, e aos 50 anos a última coisa que você quer é ter um filho com uma aventureira e dividir seu patrimônio. Se você quer insisitr no assunto, verifique constatemente se ela está ou não tomando a pílula. Precisa ver de fato, não confie nela. Muitas querem ter um filho sem marido, e você é o cara ideal para dar uma pensão alimentícia. 

27 -  O padrão mais ético na sociedade antigamente era, por incrível que pareça, a prostituta. Elas eram discretas, não telefonavam às esposas nem chanteavam os maridos com fotos feitas no Iphone. Hoje esta ética não existe mais, a que ponto chegamos, nem nelas hoje se pode confiar. 

28 -  A primeira função do sexo é procriar. Animais fazem isto todo dia, com parceiras novas numa boa. Mas nenhum usa camisinha como você. Em termo evolutivo, você está gastando energia à toa, o que Freud chamaria de comportamento neurótico. 

29 -  A segunda função do sexo é levar a parceira às nuvens para que ela volte pedindo mais, mais e mais. Isto é necessário para que ela não o troque pelo novo cacique que acabou de completar sua maioridade. A última coisa que você quer é ter um caso de fim de semana que bata na sua porta querendo mais. O que muitas vezes acontece, se você é tão bom quanto pensa. 

30 -  Existe uma última razão bem mais simples para nunca trair, que não usa a lógica, nem avalia as consequências. 

Você não trai ninguém, esposa, filhos, amigos, porque você simplesmente não é um traidor. 

Existe uma única exceção. 

Se a Cameron Dias batesse na porta do seu quarto do hotel às 2 horas implorando, por pura solidariedade humana, você pode abrir uma exceção. 

Mas não deixe de contar para a sua esposa, que se for igual a minha, ficaria feliz por mim, perguntaria os mínimos detalhes, e ligaria correndo para as amigas "Vocês não vão acreditar, o Steve comeu a Cameron Dias". 

Ou, ouviria calmamente sabendo que tudo era imaginação minha. Um ganha-ganha geral, menos para a Cameron Dias. Por: Stephen kanitz

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

RECOMEÇAR


Não importa onde você parou...
em que momento da vida você cansou...
o que importa é que sempre é possível e necessário "Recomeçar".

Recomeçar é dar uma nova chance a si mesmo...
é renovar as esperanças na vida e o mais importante...
acreditar em você de novo.

Sofreu muito nesse período?
foi aprendizado...

Chorou muito?
foi limpeza da alma...

Ficou com raiva das pessoas?
foi para perdoá-las um dia...

Sentiu-se só por diversas vezes?
é por que fechaste a porta até para os anjos...

Acreditou que tudo estava perdido?
era o início da tua melhora...

Pois é...agora é hora de reiniciar...de pensar na luz...
de encontrar prazer nas coisas simples de novo.

Um corte de cabelo arrojado... diferente...
Um novo curso... ou aquele velho desejo de aprender a
pintar... desenhar... dominar o computador...

ou qualquer outra coisa...

Olha quanto desafio...

Quanta coisa nova nesse mundão de meu Deus te esperando.

Tá se sentindo sozinho?

besteira...

Tem tanta gente que você afastou com o seu "período de isolamento"...

Tem tanta gente esperando apenas um sorriso teu para "chegar" perto de você.

Quando nos trancamos na tristeza...

nem nós mesmos nos suportamos... ficamos horríveis...

O mal humor vai comendo nosso fígado... até a boca fica amarga.

Recomeçar...hoje é um bom dia para começar novos desafios!!!

Onde você quer chegar?

Ir alto... sonhe alto... queira o melhor do melhor...

Queira coisas boas para a vida...

Pensando assim trazemos prá nós aquilo que desejamos...

Se pensarmos pequeno... coisas pequenas teremos...

Já se desejarmos fortemente o melhor e principalmente lutarmos pelo melhor... o melhor vai se instalar na nossa vida.

E é hoje o dia da faxina mental...

Jogue fora tudo que te prende ao passado...

Ao mundinho de coisas tristes... fotos...

Peças de roupa, papel de bala... ingressos de cinema...

Bilhetes de viagens... e toda aquela tranqueira que se guarda quando nos julgamos apaixonados...

Jogue tudo fora... mas principalmente... esvazie seu coração...

Fique pronto para a vida... para um novo amor...

Lembre-se somos apaixonáveis...

Somos sempre capazes de amar muitas e muitas vezes...

Afinal de contas...

Somos o "Amor"...

Carlos Drummond de Andrade

"Porque sou do tamanho daquilo que vejo, e não do tamanho da minha altura."


quinta-feira, 13 de dezembro de 2012

A ARTE DE OUVIR

Precisamos admirar não só quem fala bonito, mas quem escuta bonito.

De todos os sentidos, o mais importante para a aprendizagem do amor, do viver juntos e da cidadania é a audição. Disse o escritor sagrado: "No princípio era o Verbo". Eu acrescento: "Antes do Verbo, era o silêncio”. É do silêncio que nasce o ouvir. Só posso ouvir a verdade do outro se eu parar de tagarelar. Quem fala muito não ouve. Sabem disso os poetas, esses seres de fala mínima. Eles falam, sim. Para ouvir as vozes do silêncio. Veja esse poema de Fernando Pessoa, dirigido a um poeta: "Cessa o teu canto! Cessa, que, enquanto o ouvi, ouvia uma outra voz como que vindo nos interstícios do branco encanto com que o teu canto vinha até nós. Ouvi-te e ouvia-a no mesmo tempo e diferentes, juntas a cantar. E a melodia que não havia se agora a lembro, faz-me chorar..." A magia do poema não está nas palavras do poeta. Está nos interstícios silenciosos que há entre as suas palavras. É nesse silêncio que se ouve a melodia que não havia. Aí a magia acontece: a melodia me faz chorar.

Não nos sentimos em casa no silêncio. Quando a conversa pára por não haver o que dizer, tratamos logo de falar qualquer coisa para pôr um fim no silêncio. Vez por outra, tenho vontade de escrever um ensaio sobre a psicologia dos elevadores. Ali estamos, nós dois, fechados naquele cubículo. Um diante do outro. Olhamos nos olhos um do outro? Ou olhamos para o chão? Nada temos a falar. Esse silêncio é como se fosse uma ofensa. Aí falamos sobre o tempo. Mas nós dois bem sabemos que se trata de uma farsa para encher o tempo até que o elevador pare.

Os orientais entendem melhor do que nós. Esqueci-me do nome do filme. Duas velhinhas se visitavam. Por horas ficavam juntas, sem dizerem uma única palavra. Nada diziam, porque, no seu silêncio, morava um mundo. Faziam silêncio não por não terem nada a dizer, mas porque o que tinham a dizer não cabia em palavras. A filosofia ocidental é obcecada pela questão do Ser. A filosofia oriental, pela questão do Vazio, do Nada. É no Vazio da jarra que se colocam flores.

O aprendizado do ouvir não se encontra em nossos currículos. A prática educativa tradicional se inicia com a palavra do professor. A menininha, Andréa, voltava do seu primeiro dia na creche. "Como é a professora?", sua mãe lhe perguntou. Ao que ela respondeu: "Ela grita..." Não bastava que a professora falasse. Ela gritava. Não me lembro de que minha primeira professora, dona Clotilde, tivesse jamais gritado. Mas me lembro dos gritos esganiçados que vinham da sala ao lado. Um único grito enche o espaço de medo. Na escola, a violência começa com ataques verbais.

Milan Kundera conta a estória de Tamina, uma garçonete. "Todo mundo gosta de Tamina. Porque ela sabe ouvir o que lhe contam. Mas será que ela ouve mesmo? Não sei... O que conta é que ela não interrompe a fala. Vocês sabem o que acontece quando duas pessoas falam. Uma fala e outra lhe corta a palavra: 'É exatamente como eu, eu...' e começa a falar de si até que a primeira consiga por sua vez cortar: 'É exatamente como eu, eu...' Essa frase 'é exatamente como eu...' parece ser uma maneira de continuar a reflexão do outro, mas é um engodo. É uma revolta brutal contra uma violência brutal: um esforço para liberar o nosso ouvido da escravidão e ocupar à força o ouvido do adversário. Pois toda a vida do homem entre os seus semelhantes nada mais é do que um combate para se apossar do ouvido do outro..."

Será que era isso que acontecia na escola tradicional? O professor se apossando do ouvido do aluno (pois não é essa a sua missão?) com a força da autoridade e a ameaça de castigos, sem se dar conta de que, no ouvido silencioso do aluno, há uma melodia que se toca. Talvez seja essa a razão por que há tantos cursos de oratória, procurador por políticos e executivos, mas não haja cursos de escutatória. Todo mundo quer falar. Ninguém quer ouvir.

Todo mundo quer ser escutado. Toda criança também quer ser escutada. Encontrei, na revista pedagógica italiana Cem Mondialità, a sugestão de que, antes de se iniciarem as atividades de ensino e aprendizagem, os professores se dedicassem, por semanas, talvez meses, a simplesmente ouvir as crianças. No silêncio das crianças, há um programa de vida: sonhos. É dos sonhos que nasce a inteligência. A inteligência é a ferramenta que o corpo usa para transformar os seus sonhos em realidade. É preciso escutar as crianças, para que a sua inteligência desabroche.

Sugiro, então, aos professores que, ao lado da sua justa preocupação com o falar claro, tenham também uma justa preocupação com o escutar claro. Amamos não é a pessoa que fala bonito. É a pessoa que escuta bonito. A escuta bonita é um bom colo para uma criança se assentar...

Rubem Alves
Escritor, pedagogo, teólogo e psicanalista.
Fonte: Revista BONS FLUIDOS

"Saber ouvir é quase responder".
Pierre Marivaux

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

SEIS PASSOS PARA FELICIDADE

Recentemente soube que alguns países querem endurecer ainda mais as leis antifumo: não pode fumar no carro, para fumar tem que ter uma carteirinha, quem nasceu a partir do ano 2000 não pode comprar tabaco. Esperamos, com a boca escancarada e cheia de dentes, a morte chegar. Mas, bem saudáveis. Hoje em dia, Raul Seixas vomitaria na plateia.


A "qualidade de vida" é uma das novas formas de puritanismo, sendo o feminismo uma outra (o feminismo é a nova repressão da sexualidade).

A felicidade e o bem-estar são as chaves da vida contemporânea. Vale tudo para ser feliz.
Qualquer discussão moral é pura afetação ética. Uma época dominada pela felicidade é uma época boba. Mas não estou sozinho nesta sensação: Aldous Huxley, escritor inglês, pensava a mesma coisa.

Quando olhamos para a história da ética, vemos que o utilitarismo inglês é o modo dominante da vida contemporânea. Para mim, pessoa um tanto desconfiada de quem passa a vida querendo ser feliz, isso tudo parece "limpinho" como um hospital. Jeremy Bentham (1748-1832), pai do utilitarismo, chegou mesmo a pensar num cálculo utilitário para otimizar a felicidade.

O principio utilitário afirma que o homem foge da dor e busca o prazer (o bem-estar). Logo, devemos fazer uma sociedade que vise produzir em larga escala a felicidade, o prazer e o bem-estar. E chegamos ao nosso mundo de gente que sonha em ficar com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar, mas com saúde. A vida e a sociedade dominadas pela busca do bem-estar parecem tornar o homem menos homem.

O cálculo utilitário tem seis passos:

1 - Intensidade: o prazer dever ser o mais intenso possível.

2 - Duração: o prazer deve durar o máximo de tempo possível.

3 - Certeza: cuidado para não produzir um prazer que não é o que você deseja com aquele ato.

4 - "Remoticidade" (remoteness): o prazer deve causar efeito imediato ou o mais rápido possível.

5 - Fecundidade: o prazer A deve gerar o prazer A1, o A2 e assim por diante.

6 - Pureza: cuidado para não gerar desprazer ao invés de prazer.

Será que você já não põe isso mais ou menos em prática do seu dia a dia? Mas, dirão alguns, Bentham era um controlador, porque ele sempre pensava em termos de um centro (expert) controlando a periferia (as pessoas comuns).

Bentham ficará conhecido como o utilitarista antidemocrático, sendo John Stuart Mill (1806-1873) o utilitarista democrático. De acordo com este, maior representante da segunda geração de utilitaristas, a sociedade (os indivíduos) deve livremente buscar esse prazer.

Mas o que percebemos é que, ainda que Mill falasse muito em liberdade e contra o abuso de poder (cara simpático para a moçada que gosta de falar coisa bonitinha, tipo Obama), não adianta acusar o "centro do poder" de controlador, porque são as próprias pessoas que querem os seis passos para a felicidade de Bentham.

Isso cria o efeito de esmagamento típico do puritanismo de massa em que vivemos: saúde e felicidade. Fizéssemos um plebiscito, quase todo mundo escolheria uma gaiola feliz.

"Comunidade, identidade, estabilidade." O bem é sempre para todos, a identidade é o que nos une, a vida deve ser estável. Slogan que venderia bem no mundo para o qual seguimos a passos largos com esse utilitarismo social em que vivemos, com um controle cada vez maior dos gestos, do pensamento e dos hábitos em nome da "comunidade, identidade, estabilidade".

Esse era o slogan do mundo perfeito que Huxley criticou em seu "Admirável Mundo Novo" (1932), mas podia ser o de qualquer um dos proponentes bonitinhos do controle político da vida em nome do bem.

Louis Pojman, professor de filosofia da Academia Militar de West Point (EUA), chama isso de "tragédia da liberdade".

Toda liberdade pressupõe riscos, e toda sociedade pautada pela felicidade social não suporta a liberdade. Estamos caminhando a passos largos para uma dessas.

Toda a cultura intelectual está infestada de amor à felicidade social e de ódio ao indivíduo. O pesadelo totalitário não passou. Agora ele vem sob o disfarce da opinião pública e da vontade coletiva. Por: Luiz Felipe Pondé, Folha de SP

domingo, 9 de dezembro de 2012

O AMOR QUE NÃO OUSA LADRAR SEU NOME

Confesso: nunca tive paixões por animais. Falo de paixões românticas, arrebatadoras, sejam platônicas ou mesmo carnais. Nunca perdi a cabeça por um porco, nunca me apaixonei por um cavalo, nunca pensei em constituir família com uma vaca ou uma galinha.


Às vezes penso que a culpa é da minha educação: uma educação repressiva, católica, claramente "especista", para quem os seres humanos eram seres humanos, os animais eram animais. E a arca de Noé não era a casa da mãe Joana. Terei perdido alguma coisa?

Provavelmente. Michael Kiok, líder de um dos principais grupos zoófilos da Alemanha, tem alguns pensamentos sobre o assunto. Aos quatro ou cinco anos, conta Kiok à revista "Der Spiegel", ele olhava para os animais domésticos com uma ternura especial. Nada de alarmante: quem, em juízo perfeito, não gosta de afagar um cachorro ou sentir o doce ronronar de um gato?

Acontece que os sentimentos de Kiok pela bicharada começaram a ganhar outros contornos na adolescência. Contornos eróticos que levaram a atos eróticos.

Para Kiok, que se escusa a esclarecer se hoje mantém relacionamentos monogâmicos ou promíscuos com bípedes ou quadrúpedes, os animais não são animais, muito menos "irracionais". São parceiros de pleno direito, que sabem como expressar a sua afetividade. Mais: segundo palavras do próprio, "os animais são mais fáceis de compreender do que as mulheres".

Sobre este último ponto, e com o devido respeito a Kiok, tenho dúvidas. É um fato que até Freud, no leito da morte, terá confessado uma certa frustração por partir deste mundo sem nunca ter entendido a cabeça feminina.

Mas o mundo evoluiu muito depois de Freud. E existe literatura abundante sobre os sinais românticos que as mulheres gostam de emitir para conquistar um homem. A forma como falam. Como sorriem. Como mexem no cabelo. Como tocam casualmente no braço do potencial parceiro.

Como será o olhar apaixonado de um bode? A disponibilidade sexual de uma cabra? O momento sacramental em que um hamster se rende às evidências, desiste de pedalar a sua roda e está pronto para ser beijado?

Temo bem que todas essas perguntas ficarão agora sem resposta. Isso porque a Alemanha tenciona ilegalizar o bestialismo com multas que podem atingir os 25 mil euros (mais de R$ 65 mil).

A Alemanha está cansada de pertencer ao mesmo clube que a Dinamarca, a Suécia e, claro, a Bélgica, onde o bestialismo é legal (no duplo sentido da palavra). Agora, através da câmara baixa do Parlamento, Berlim quer punir "comportamentos impróprios" com a espécie animal.

Não sei que dizer. Por um lado, entendo a necessidade de proteger os animais indefesos do país, que continuam à mercê dos cerca de 100 mil predadores sexuais que se aproveitam da fraqueza emocional de um pato ou de um esquilo para fazerem o que não têm coragem de fazer com um ouriço.

Mas que fazer nos casos de paixão correspondida? Devemos nós, humanos arrogantes, legislar afetos que não entendemos?

Por outro lado, prevejo dificuldades na aplicação da lei. A primeira, evidente, é saber como detectar casos de assédio e, sobretudo, agressões consumadas.

Partindo do pressuposto de que o testemunho de um animal não tem grande peso na justiça, como detectar o olhar amedrontado de uma ovelha, obrigada a fugir continuamente das investidas do seu pastor? E como agir a tempo e horas quando, em prados ou chiqueiros, canis ou capoeiras, se estiver na iminência de um crime?

Sem falar do óbvio: se o Parlamento alemão deseja punir as "relações impróprias", o que será uma relação apropriada? Onde traçar a linha? Será possível beijar um cachorro? Em caso afirmativo, com língua ou sem língua? E, já agora, língua dele ou língua nossa?

Dúvidas, dúvidas, dúvidas. E, suspeito, o início de uma vida clandestina para amantes como Michael Kiok, condenados a viver as suas histórias nos calabouços da clandestinidade.

Só espero que Michael, e milhares como ele, não desistam dos seus sonhos e sigam em frente. A grande literatura romântica sempre se fez de amores proibidos. Tenho a certeza que a perseguição de hoje será um novo capítulo na história literária de amanhã.

Por: João Pereira Coutinho Folha de SP

A TIRANIA DO FUTURO


Imagine o leitor que era possível saber, com algum grau de certeza, o futuro clínico do seu filho ainda por nascer. Estaria disposto a dar esse passo?

Não, o cenário não é produto da imaginação fílmica de Hollywood. Em artigo para a "Slate", Harriet Washington levanta o véu sobre esse admirável mundo novo: pesquisadores americanos desenvolveram uma técnica pré-natal que permite isolar o DNA do feto a partir do sangue da mãe.

Depois, com essa preciosa informação genética, será possível compor uma lista generosa com os todos os genes "problemáticos" da futura criança.

Em teoria, será possível saber se aquela vida será longa e saudável; ou, pelo contrário, se terá uma tendência genética pronunciada para desenvolver certos tipos de câncer ou outras doenças igualmente graves.

No artigo, a autora levanta alguns problemas que a descoberta pode trazer. Problemas práticos, médicos, sociais, parentais, que se resumem na pergunta: o que fazer com essa informação genética? Devem os médicos fornecê-la aos pais?

E, em caso afirmativo, como proceder ante a possibilidade de uma criança nascer com maior tendência genética para desenvolver uma doença incapacitante, dolorosa ou fatal? Será o aborto uma hipótese? Melhor ainda: será o aborto uma hipótese com base apenas numa hipótese?

Boas perguntas. Infelizmente, todas elas esquecem um pormenor: a existência de um feto. Ou, dito de outra forma, a existência de uma vida em potência que não pertence aos médicos ou aos pais.

Essa vida pertence a um ser humano único, com um trajecto singular pela frente, e que transporta apenas nos genes um risco maior de desenvolver doenças que sempre fizeram parte da nossa paisagem comum.

Saber que um filho pode ter Alzheimer na velhice é um pensamento angustiante, sem dúvida. Mas é também permitir que um futuro fantasmagórico possa destruir retrospectivamente todas as idades anteriores desse filho.

Ceder a esse fantasma é ceder a uma tirania sobre a infância, sobre a adolescência, sobre a maturidade. É ceder a uma tirania sobre as alegrias e tristezas, as vitórias e derrotas, os amores e desamores que fazem parte de qualquer experiência humana.

No fundo, é como se pudessemos afirmar, do alto da nossa arrogância científica, que nenhuma vida pode ter valor apenas porque existe a possibilidade séria de uma doença séria se intrometer no caminho de quem a vive.

Um pensamento desses não é apenas uma forma extrema e quase delirante de eugenia - a visão aterradora de que a Terra deve ser apenas herdada por seres perfeitos e, de preferência, imortais.

É também uma desistência covarde antes mesmo dessa vida começar.

Por: POR JOÃO PEREIRA COUTINHO Publicado na Folha de São Paulo.

sábado, 8 de dezembro de 2012

TODA ESCOLA É IGUAL

Muitos pais estão fazendo uma verdadeira procissão a escolas procurando a melhor delas para matricular seu filho no próximo ano.


Vários deles procuram a escola perfeita, outros procuram uma instituição que seja amigável para o filho que tem determinadas características de comportamento, de relacionamento ou de aprendizagem. Há ainda os que procuram um colégio "puxado" e também os que procuram uma educação com métodos "alternativos".

Qual será a melhor escola para colocar o filho? Já que muitos pais estão nesta época envolvidos com tal questão, valem algumas reflexões a respeito de nossas escolas.

Vamos começar a pensar nas instituições avaliadas como boas pela maioria dos pais. Vale a pena considerar os motivos de tal avaliação, os quais, aliás, são bem diferentes mesmo quando dizem respeito à mesma escola.

Boas avaliações em exames nacionais e aprovação de muitos alunos em determinadas faculdades costumam ser índices que agradam a muitos pais. Espaço físico imponente e presença de tecnologia também. Há ainda a tradição familiar: os pais --ou um deles-- estudaram na escola, assim como os avós, e conseguiram realização profissional e financeira.

Há também os que ficam satisfeitos porque percebem que o colégio transmite um volume grande de conteúdo nas disciplinas ministradas e isso parece bom, mesmo que exija que o filho tenha de recorrer a aulas particulares para acompanhar o ritmo.

Depois das bem avaliadas há as medianas e as consideradas "fracas". Por último, as públicas, pelo menos para a classe média.

Por que os pais colocam seus filhos em escolas que consideram apenas medianas ou fracas? Em geral porque são as que conseguem pagar ou então porque acham que o filho não irá acompanhar uma escola mais forte.

Pois está na hora de repensarmos essa questão. Das escolas mais bem avaliadas às consideradas mais fracas, todas seguem o mesmo padrão de ensino. Conhecemos bem a organização dessas instituições porque nós passamos por elas, assim como nossos pais e avós.

E essa organização, por mais ultrapassada que seja, acaba por nos passar a ideia de segurança. Falsa segurança, é bom ressaltar. Sabe por quê, leitor?

Porque essa ideia de escola não ensina o aluno a pensar, não contempla as diferenças entre eles, não oferece oportunidades para a conquista da autonomia, não promove a paz, a boa convivência, a liberdade, tampouco as relações democráticas.

Esse modelo de ensino mata a sede de conhecimento, a curiosidade, a vontade de pesquisar e de questionar. Essa escola quer alunos medianos e obedientes, é isso.

Então quer dizer que essa instituição é decadente? Sim, caro leitor, absolutamente decadente e ultrapassada. E por que, então, existe até hoje? Porque queremos que exista. Fazemos de tudo para manter esse modelo, até mesmo colocamos parte da responsabilidade dele nos pais! Queremos que essa organização permaneça porque nos parece conveniente, afinal.

Se você acha que seu filho aprende bastante desse jeito, você não imagina o quanto ele poderia aprender em uma instituição que tivesse como centro o aluno e não as disciplinas do conhecimento organizadas de modo linear e em objetivos mensuráveis.

Se você acha que seu filho não gosta de estudar, você não faz ideia de quanto prazer ele poderia ter em decifrar os enigmas do conhecimento em uma escola que não se interessasse tanto pelas respostas, e sim por boas perguntas.

Considerando esse modelo que as instituições de ensino seguem, tanto faz esta ou aquela porque, no fundo, são todas iguais. São mais parecidas do que você imagina.

Se você quiser pensar mais a esse respeito, vale muito a pena assistir ao filme "La Educacion Prohibida", disponível com legendas em português no endereçotinyurl.com/laeducacion   Por: Rosely Sayão

RAZÃO E RELINCHOS

Existe um livro de Schopenhauer chamado "Como Vencer um Debate sem Precisar Ter Razão" (ed. Topbooks). Um dos riscos de escrever uma coluna de jornal hoje, ou de opinar em qualquer instância pública, é o oposto: ser ignorado, quando não perseguido e açoitado num pelourinho de grunhidos, relinchos e cacarejos, a despeito da mais cuidadosa argumentação.


Convencer alguém a mudar de ideia não é algo comum em nosso tempo. Basta uma semana nas redes sociais para perceber: militantes pró e contra aborto, descriminação da maconha, eutanásia, cotas, cabras e sobrenomes Guarani-Kaiowá, a maioria está ali para confirmar certezas prévias ou se irritar com quem diz o contrário.

Uma radicalização que também nasce do meio: para que os palpites sejam ouvidos entre tantas vozes, a tendência é que o adjetivo prevaleça sobre o termo exato, a ênfase sobre a ponderação, as regras generalizantes sobre as nuances que tiram a graça e o colorido das frases e slogans.

Num cenário assim, não é difícil adotar um tom nostálgico ou apocalíptico. Talvez se possa lamentar o fim de uma suposta era de ouro dos debates elevados. Prefiro seguir achando que a humanidade não mudou tanto: apenas passamos a ouvir, graças a uma tecnologia muito mais benéfica que perniciosa, que criou possibilidades infinitas de compartilhamento de informação, as conversas antes restritas a botecos. É um choque descobrir que amigos são tão ignorantes, levianos ou idiotas, claro, mas até isso tem seu lado positivo.

De certa forma, estamos diante de um problema das democracias maduras, que já superaram -ou deviam ter superado- questões graves referentes à liberdade de discurso. Ou seja, não estou falando da lei, que proíbe censura, calúnia, injúria e difamação. Nem da ética, que repele a desonestidade intelectual sem que seu autor precise ir para a cadeia. Estou falando é de etiqueta, a "pequena ética" que em sua face menos elitista propõe tolerar os modos alheios -um caminho para, quem sabe, prestar atenção ao que eles representam.

Isso porque linguagem e tom -que são maneiras de segurar os talheres num debate- nem sempre arruínam as ideias por terem aparência tosca. Dá um pouco de cansaço, por exemplo, quando bikers defendem suas propostas para o trânsito com tamanha agressividade. Ou quando a pecha de "fascista", misturada à teoria política da salmonela, aparece na discussão sobre bisnagas de plástico proibidas em feiras e lanchonetes. Ainda assim, tudo a favor de ciclovias e meios alternativos de transporte, e abaixo aqueles saquinhos tristes de ketchup e mostarda.

Num ensaio de 2005, um nome insuspeito quando o tema é a consequência das palavras -Salman Rushdie, que passou anos escondido por causa de um livro considerado blasfemo pelo Irã- escreveu: "Na Universidade de Cambridge, me ensinaram (...) que não se deve ser grosseiro com a pessoa com quem se discute, mas se pode ser extremamente grosseiro em relação a tudo que ela pensa". Parece uma citação descabida num texto sobre etiqueta. Na verdade, é a lembrança de uma regra ideal em debates: deveria importar o que é dito, e não quem diz. É o que impede um interlocutor de ser desqualificado por gênero, crença, classe ou etnia.

Forçando um pouco a boa-fé, por que não abstrair também o partido em que o interlocutor vota, a empresa jornalística onde trabalha, os amigos que tem? Ou suas deficiências retóricas, sua ingenuidade, sua queda pelo vitimismo, pelo sentimentalismo, pelo insulto? A distinção total entre texto e autor é utópica, e o conteúdo de uma ideia pode ser indistinguível de sua forma, e às vezes tudo se resume mesmo a interesse ou tolice, mas o esforço para enxergar um pouco além disso é sempre virtuoso. Pensar com liberdade, o melhor atalho para identificar o lado certo numa disputa, passa por ouvir e aprender com vozes dissonantes. Mesmo que o timbre delas seja mais frequente em zoológicos, penitenciárias e hospícios. Por: Michel Laub, Folha de SP