quinta-feira, 5 de julho de 2012

A CURA GAY

Em 1980, a homossexualidade sumiu do "Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais". Em 1990, ela foi retirada da lista de doenças da Organização Mundial da Saúde. 

Médicos, psiquiatras e psicólogos não podem oferecer uma cura para uma condição que, em suas disciplinas, não é uma doença, nem um distúrbio, nem um transtorno. Isso foi lembrado por Humberto Verona, presidente do Conselho Federal de Psicologia, numa entrevista à Folha de 29 de junho. 

No entanto, o deputado João Campos (PSDB-GO), da bancada evangélica, pede que, por decreto legislativo, os psicólogos sejam autorizados a "curar" os homossexuais que desejem se livrar de sua homossexualidade. 

Um pressuposto desse pedido é a ideia de que os psicólogos saberiam como mudar a orientação sexual de alguém (transformá-lo de hétero em homossexual e vice-versa), mas seriam impedidos de exercer essa arte --por razões ideológicas, morais, politicamente corretas etc. 

Ora, no estado atual de suas disciplinas, mesmo se eles quisessem, psicólogos e psiquiatras não saberiam modificar a orientação sexual de alguém --tampouco, aliás, eles saberiam modificar a "fantasia sexual" de alguém (ou seja, o cenário, consciente ou inconsciente, com o qual ele alimenta seu desejo). 

Claro, ao longo de uma terapia, alguém pode conseguir conviver melhor com seu próprio desejo, mas sem mudar fundamentalmente sua orientação e sua fantasia. 

Por via química ou cirúrgica (administração de hormônios ou castração real --todos os horrores já foram tentados), consegue-se diminuir o interesse de alguém na vida sexual em geral, mas não afastá-lo de sua orientação ou de sua fantasia, que permanecem as mesmas, embora impedidas de serem atuadas. A terapia pela palavra (psicodinâmica ou comportamental que seja) tampouco permite mudar radicalmente a orientação ou a fantasia de alguém. 

 O que acontece, perguntará João Campos, nos casos de homossexualidade com a qual o próprio indivíduo não concorda? Posso ser homossexual e não querer isso para mim: será que ninguém me ajudará? 

Sim, é possível curar o sofrimento de quem discorda de sua própria sexualidade (é a dita egodistonia), mas o alívio é no sentido de permitir que o indivíduo aceite sua sexualidade e pare de se condenar e de tentar se reprimir além da conta. 

Por exemplo, se eu não concordo com minha homossexualidade (porque ela faz a infelicidade de meus pais, porque sou discriminado por causa dela, porque sou evangélico ou católico), não posso mudar minha orientação para aliviar meu sofrimento, mas posso, isso sim, mudar o ambiente no qual eu vivo e as ideias, conscientes ou inconscientes, que me levam a não admitir minha orientação sexual. 

Campos preferiria outro caminho: o terapeuta deveria fortalecer as ideias que, de dentro do paciente, opõem-se à homossexualidade dele. Mas o desejo sexual humano é teimoso: uma psicoterapia que vise reforçar os argumentos (internos ou externos) pelos quais o indivíduo se opõe à sua própria fantasia ou orientação não consegue mudança alguma, mas apenas acirra a contradição da qual o indivíduo sofre. Conclusão, o paciente acaba vivendo na culpa de estar se traindo sempre --traindo quer seja seu desejo, quer seja os princípios em nome dos quais ele queria e não consegue reprimir seu desejo. 

Isso vale também e especialmente em casos extremos, em que é absolutamente necessário que o indivíduo controle seu desejo. Se eu fosse terapeuta no Irã, para ajudar meus pacientes homossexuais a evitar a forca, eu não os encorajaria a reprimir seu desejo (que sempre explodiria na hora e do jeito mais perigosos), mas tentaria levá-los, ao contrário, a aceitar seu desejo, primeiro passo para eles conseguirem vivê-lo às escondidas. 

O mesmo vale para os indivíduos que são animados por fantasias que a nossa lei reprova e pune. Prometer-lhes uma mudança de fantasia só significa expô-los (e expor a comunidade) a suas recidivas incontroláveis. Levá-los a reconhecer a fantasia da qual eles não têm como se desfazer é o jeito para que eles consigam, eventualmente, controlar seus atos. 

 Agora, não entendo por que João Campos precisa recorrer à psicologia ou à psiquiatria para prometer sua "cura" da homossexualidade. Ele poderia criar e nomear seus especialistas; que tal "psicopompos"? Ou, então, não é melhor mesmo "exorcistas"? Por: Contardo Calligaris, Folha de SP

SABER SILENCIAR

Querido leitor, rogo que você esteja bem. Nosso tema hoje é sobre saber silenciar. 


Xenócrates, discípulo de Platão, escreveu: “Arrependo-me de coisas que disse, mas jamais do meu silêncio”. Como já falei aqui neste espaço, quando li a frase de Xenócrates, lembrei-me de pronto das muitas vezes que acordei com a ressaca depois de um pouco mais de vinho da noite anterior. Mas a dor de cabeça não era pelo excesso da bebida, e sim pelo excesso de palavras. 


No programa Fantástico da Rede Globo, do último dia 25 de maio, a apresentadora Xuxa concedeu uma entrevista que é, no mínimo, intrigante. Falou de um grande número de temas, como fama, família, filha, amor, mas o que mais mexeu com as pessoas foi o fato dela, agora, a beira de completar 50 anos, dizer que foi abusada sexualmente quando criança. Para alguém tão esclarecido, por que só agora resolve denunciar algo tão grave? 


Como sabemos, existem vários tipos de violência, aquela que agride e aquela que é sutil, mas é tão letal ou pior que a outra. Assim também existem vários tipos de abusos. Há os que finalizam um ato carnal, mas há também os que despertam desejos de consumismo. Há os abusos que erotizam meninas precocemente, vulgarizam as relações, vendem bolsinhas, vendem sandalhinhas, vendem bonecas, vendem roupas, vendem cd´s de músicas, vendem chicletes, iogurtes e brinquedos. Vender, vender, vender. Este contrassenso me parece um estranho amor. 


Em uma aberta crítica ao que ela diz como “jogo de marketing”, a psicóloga carioca Heloísa Lima lembra da história de Xuxa. Para ela, os programas da rainha dos baixinhos estimulando a sexualidade de forma tão precoce, “as meninas perderam grande e preciosa fase do seu desenvolvimento natural. E reduzir o período da inocência, certamente, acarretou-lhes desdobramentos nefastos. Daí para ideia, cada vez mais presente, da infância como objeto a ser apreciado, desejado, exaltado, numa espécie de pedofilização generalizada na sociedade foi, apenas, um pequeno passo”. 


Muitas vezes somos avaliados e julgados pelo que dissemos, é verdade. Mas o que falamos é comparado ao que fazemos, ao que fomos e somos. Quando a prática não é o discurso é prudente que reflitamos e até que nos calemos. “Arrependo-me de coisas que disse, mas jamais do meu silêncio”, eis um bom ensinamento para estas ocasiões. 


Há momentos e momentos. Há momentos de falar e há momentos de calar. Contudo, como saber qual o mais apropriado? Na dúvida, talvez a melhor fala seja o silêncio. É assim como o mundo me parece hoje. 


E você, o que pensa sobre saber silenciar? Por: Beto Colombo

terça-feira, 3 de julho de 2012

UMA DEFESA DA HIPOCRISIA

Ironias da vida: falamos com uma pessoa de tendências progressistas sobre a liberalização das drogas. Ela concorda: as políticas repressivas falharam. Só a liberalização diminui o tráfico. 

E, além disso, cada um sabe de si na forma como usa e abusa da própria liberdade: quem sou eu para impor a terceiros os meus pontos de vista moralistas e repressivos? 

Calma, camaradas. Tanta violência retórica não se justifica: já escrevi repetidas vezes que o meu "conservadorismo de costumes" só se aplica a matérias de vida ou morte. 

A liberdade individual termina quando começa a liberdade dos outros? Deploro esse clichê. 

Melhor dizer que a liberdade individual termina quando está em causa uma vida humana --a do próprio ou a de terceiros. Aborto, eutanásia, suicídio assistido, pena de morte-- não contem comigo para a jornada. 

Mas contem comigo para o resto. E o resto, lamento informar, inclui a prostituição também. 

Sim, eu sei: idealmente, o amor não deveria estar à venda, embora seja sempre possível contar a piada de que a única diferença entre sexo pago e sexo grátis é que sexo grátis, normalmente, fica mais caro. 

Aqui, o meu interlocutor progressista hesita. Se mudamos o gênero da palavra e escrevemos "interlocutora", o feminismo vem à tona e decide o assunto: a prostituição degrada as mulheres, alimenta o tráfico de seres humanos e deve ser reprimida pelas autoridades. 

Um bom exemplo dessa atitude radical está na França. Leio nos jornais que o governo progressista de François Hollande tem um Ministério dos Direitos das Mulheres. 

E a ministra, Najat Vallaud-Belkacem, quer acabar com a prostituição no país. A sra. Vallaud-Belkacem, manifestamente, nunca leu Maupassant ou Flaubert, escritores que construíram o melhor da literatura francesa no conforto dos bordéis. 

Para a ministra, é preciso um plano de ação contra o negócio, desmantelando redes de tráfico e proxenetismo. Os clientes também serão duramente penalizados. 

Perante essa deriva persecutória, só me resta dizer: "bonne chance, madame". Mas também acrescento que a ambição governamental será inútil e, além disso, abusiva. 

Começa por ser abusiva porque o governo francês confunde tudo: tráfico de seres humanos com a decisão autônoma de alguém vender o corpo para fins sexuais. 

As duas situações não habitam o mesmo plano moral. Traficar ou escravizar alguém é um crime contra a liberdade de terceiros. Vender o corpo para fins sexuais pode ser uma degradação da condição humana do sujeito --ou, para usar a linguagem kantiana, uma forma de sermos tratados como um meio, não como um fim. 

Mas essa decisão, moralmente condenável, não constitui uma ameaça para ninguém. A minha vida e mesmo a minha liberdade não estão ameaçadas se a vizinha do lado gosta de receber cavalheiros ao serão. 

Por outro lado, a ambição do governo francês será também inútil. A prostituição não é apenas a mais velha profissão do mundo. Como dizia Nelson Rodrigues, com sua insuperável sabedoria sobre a natureza humana, é também a mais velha vocação. 

E nem todas as leis serão capazes de alterar a realidade: enquanto houver gente disposta a vender e a comprar sexo, haverá um mercado para o negócio. 

A única diferença é que, em países que fizeram da proibição uma cruzada, esse mercado funciona na clandestinidade, desprotegendo ainda mais as mulheres que o Estado imagina proteger. 

Nada disso significa, obviamente, que cabe ao Estado regular a atividade como se a prostituição fosse apenas mais um negócio entre vários. Ou, pior ainda, que o Estado pode legitimamente lucrar com ele, taxando os seus proventos. 

O Estado não deve ser um proxeneta coletivo. Tolerar a prostituição significa apenas isso: tolerar. O fato de algo ser moralmente condenável não significa que deva ser legalmente proibido. 

A hipocrisia, como dizia um francês ilustre, pode ser a homenagem que o vício presta à virtude. Mas, sem essa homenagem, as sociedades humanas seriam lugares inóspitos para habitar. Por: João Pereira Coutinho, Folha de SP

DIFÍCIL DIANGNÓSTICO

Excluindo as doenças mentais mais graves - nas quais as perturbações das funções psíquicas são facilmente reconhecíveis através de sintomas como delírios, alucinações ou crises de agitação psicomotora -, é difícil estabelecer um diagnóstico em psiquiatria. Não há parâmetros unívocos para detectar com precisão as alterações na estrutura do pensamento, na produção das ideias, na intensidade da atenção, nas nuances da senso-percepção. As fronteiras entre a chamada normalidade e a psicopatologia não são bem delimitadas e mudam em função das circunstâncias socioculturais. O psiquiatra conta apenas com a capacidade de observação e a subjetividade para avaliar este imponderável material que é a vida psíquica. Isso faz com que os diagnósticos em psiquiatria muitas vezes oscilem, não tenham a firmeza desejada. Em 1952, a Associação Psiquiátrica Americana (APA) lançou a primeira versão do Manual de Diagnóstico e Estatística dos Distúrbios Mentais, que passou a ser mundialmente conhecido como DSM. Suas três primeiras versões não diferiam muitos dos grandes compêndios de psiquiatria, com suas densas descrições da psicopatologia, na maioria das vezes baseadas em pressupostos psicanalíticos. Em 1980, saiu sua terceira edição, o DSM3, com um enfoque diferente, procurando uniformizar e padronizar os dados observados, com o objetivo de deixar os diagnósticos psiquiátricos menos vagos e imprecisos. Grosso modo, ao invés de atentar para os meandros do psiquismo e as profundezas da psicopatologia ou da psicodinâmica psicanalítica, o DSM3 se centrou no registro dos sintomas observáveis no pragmatismo e na conduta do paciente, mais fáceis de quantificar e avaliar estatisticamente. Os motivos conscientes ou inconscientes que poderiam estar ligados a estes sintomas não são valorizados, não é feita uma relação de causa e efeito entre vivências existenciais traumáticas e a sintomatologia. O exame psiquiátrico não se interessa pela vida do paciente. Esse enfoque reflete uma mudança na própria abordagem e compreensão da doença mental. Abandonou-se a visão analítica psicogênica e se defende a ideia de que o funcionamento normal do psiquismo resulta do equilíbrio dos neurotransmissores cerebrais, substâncias existentes entre os neurônios a facilitarem a circulação dos impulsos e sinais. Os sintomas seriam evidências do desequilíbrio dos neurotransmissores. Em sendo assim, não importam as vivências atuais e passadas do paciente e sim o repertório de sintomas que exibe e que será eliminado com uma medicação que devolve aos neurotransmissores o equilíbrio perdido. As psicoterapias são desvalorizadas e quando indicadas, devem seguir a linha cognitivista, que ensina o paciente a lidar com o sintoma através de treinamentos e condicionamentos conscientes. Não pode ser ignorado que este panorama se instala dentro de dois grandes referenciais econômicos - a indústria farmacêutica e os seguros-saúde, ambos beneficiados pela ênfase quase exclusiva na medicação. O primeiro, pelo incremento nas vendas, pois das medicações prescritas nos Estados Unidos, as psicotrópicas são as mais vendidas, tendo movimentado mais de US$ 14 bilhões em 2008. O segundo, que passa a impor para os segurados um modelo cognitivo de terapia com poucas sessões, que lhes é bem mais barato do que as longas terapias que antes tinham de pagar. Largo debate se estabeleceu desde então. Os aspectos positivos deste enfoque são a tentativa de uniformização dos critérios diagnósticos, compartilhados facilmente por psiquiatras de várias culturas e formações diversas, o que deu novo alento à pesquisa e epidemiologia em psiquiatria. Como pontos negativos, ressalta-se a proliferação desenfreada de diagnósticos, a patologização e medicalização de modos de ser, a expansão para a infância de diagnósticos antes restritos a outras faixas etárias, como o transtorno bipolar. A própria psiquiatria sofre uma certa desumanização, na medida em que o paciente fica despojado de sua singularidade, em que sua história é ignorada. Descarta-se o saber psicanalítico e a consulta psiquiatra fica rebaixada a um mero check-list de sintomas, na qual o paciente não tem oportunidade de falar de sua angústia e sofrimentos. Ao relegar sua vertente psicoterápica a um segundo plano e enfatizar excessivamente o lado medicamentoso, cuja importância não pode ser diminuída, a prática psiquiátrica fica empobrecida. Além do mais, se a psicopatologia fica reduzida a um mero desequilíbrio dos neurotransmissores, qualquer médico não psiquiatra se sente autorizado a passar antidepressivos e tranquilizantes, como ocorre atualmente. Este é o pano de fundo que se instalou progressivamente desde os anos 80. Agora se aguarda com expectativa o DSM5, a quinta edição do manual, a ser lançada em maio do próximo ano. No último dia 11, o dr. Allen Frances, que liderou uma das forças-tarefa do DSM4, escreveu um artigo no New York Times fazendo pesadas críticas ao modo como os trabalhos estão sendo encaminhados. Allen teme que o DSM5 seja um "desastre", pois insiste em ampliar cada vez mais os critérios diagnósticos, invadindo a infância e procurando transformar as preocupações, angústias e tristezas inerentes à vida em sintomas a serem medicados. Com isso, "introduzirá muitos diagnósticos novos e não comprovados que irão medicalizar a normalidade", resultando numa "fartura desnecessária e prejudicial de prescrição medicamentosa". Allen diz que a fabricação de diagnósticos - desvio no qual as DSM são pródigas - é mais danosa do que a proliferação de medicação, embora uma coisa leve à outra. Apesar de afastar a acusação mais comum de que o grupo do DSM5 está atrelado à indústria farmacêutica, sabe-se que mais de 70 % dele declarou ter algum tipo de vínculo com ela. Allen vai mais longe ao propor que a própria APA abdique da função de estabelecer o que é mentalmente são ou doente, pois acredita que o mundo mudou e que essa atribuição não pode mais ficar restrita a uma associação de psiquiatria e, sim, a um leque muito mais vasto de representantes da sociedade. Vê-se que o DSM tentou resolver um problema - a excessiva subjetividade na formulação do diagnóstico - e caiu noutro, a produção excessiva de diagnósticos "objetivos". É um impasse, que não deve ser entendido como uma prova da insuficiência da psiquiatria e, sim, como evidência da complexidade do fenômeno do qual ela trata. Não é fácil medir e pesar a loucura dos homens, como tão bem sabia Machado de Assis. Em O Alienista, o Dr. Simão Bacamarte também oscilava em firmar o diagnóstico - serão todos loucos em Itaguaí, ou não há louco nenhum? Sem chegar a uma conclusão, termina por se internar sozinho no Hospício de Casa Verde, numa decisão mais filosófica do que clínica.Por: Sergio Telles O Estado de S Paulo

MEMÓRIA TRAIÇOEIRA

A atriz Lizandra Souto e o ex-jogador de vôlei Tande se separaram, supostamente por causa de traição da parte dele (que nega veementemente os boatos). Em desabafo, a bonita atriz disse que Tande não foi um bom marido. Eles foram casados por 15 anos e têm dois filhos. Algumas pessoas alegam que é deselegante falar mal de alguém com quem se viveu junto por tanto tempo. Mas meu foco aqui é outro: o viés cognitivo de uma memória traiçoeira. 

No excelente livro Thinking Fast and Slow, que pretendo resenhar em breve, o Prêmio Nobel de Economia Daniel Kahneman, especialista em economia comportamental, explica em um dos capítulos como nossa memória pode nos enganar e nos levar a decisões incoerentes. O livro todo, aliás, é uma bomba para a teoria das expectativas racionais, comum entre muitos economistas. 

No capítulo "Two Selves", Kahneman separa a utilidade experimentada daquela lembrada no momento das decisões. Um experimento realizado por ele demonstra bem a diferença. Participantes foram divididos em dois grupos, e ficaram expostos a dor com uma das mãos mergulhadas em água gelada (14 graus). O primeiro grupo ficou primeiro exposto por 60 segundos, e depois de 7 minutos, por 90 segundos, sendo que nos últimos 30 segundos a temperatura da água subiu 1 grau, aliviando um pouco a sensação de dor. O outro grupo seguiu a ordem inversa. Controlando o experimento para variáveis exógenas, cada grupo teve a opção de escolher qual experimento repetir uma terceira vez: o de 60 segundos ou o de 90 segundos. Os participantes sabiam que o tempo de cada um era diferente, e qual era o mais longo. Entretanto, 80% dos participantes escolheram repetir o experimento de maior duração! O que pode explicar isso? 

Segundo Kahneman, e com base em outros experimentos, nós damos mais valor ao pico das sensações de prazer ou dor, e à lembrança mais recente da sensação. Se alguém sentiu dor por mais tempo, mas há mais tempo, então a tendência é lembrar da experiência como menos dolorosa do que alguém que acabou de sofrer. A duração da dor importa menos que seu pico ou quão recente ela foi. 

O autor afirma que as memórias são tudo que nós temos de nossa experiência de vida, e que o "eu da memória" acaba sendo mais importante do que o "eu da experiência". Como nós lembramos das coisas faz toda a diferença do mundo. Confundir a experiência concreta com a memória que fica dela é uma ilusão cognitiva. Como a memória pode estar errada, mas é ela quem nos governa em nossas decisões, somos levados a fazer inúmeras escolhas erradas e incoerentes. 

E o que isso tudo tem a ver com Lizandra Souto e Tande? Tudo! No final de cada capítulo do livro, Kahneman coloca alguns comentários do cotidiano para reforçar a lição daquele capítulo. O exemplo deste capítulo em questão foi justamente o seguinte: "Você está pensando em seu casamento fracassado totalmente pela perspectiva do eu da memória. Um divórcio é como uma sinfonia com um som estridente no final - o fato de que acabou mal não significa que foi tudo ruim". 

Alguém passa 15 anos compartilhando com o outro momentos bons e ruins, em intensidades diferentes. Mas dependendo do momento em que ele for questionado sobre a felicidade da experiência, a resposta poderá ser bastante diferente. Alguém que viveu mais momentos prazerosos, mas teve um pico elevado de sofrimento ou acabou de ter uma experiência negativa, poderá concluir que foi bem menos feliz do que outro que viveu um "inferno" constante, mas com picos de dor menos intensos e com a última semana razoavelmente feliz. Assim é o homem (e a mulher): vítima da memória míope e traiçoeira.Por: Rodrigo Constantino

RELAÇÕES COMO NEGÓCIO

Querido leitor, aceite o meu fraternal abraço. Nosso tema de hoje é sobre relações como negócio e é baseado em um artigo escrito no jornal “Financial Times”, periódico de economia de maior circulação em todo o mundo. O artigo em questão foi do articulista Philip Stephens em resposta a uma carta de uma leitora que escreveu aos editores pedindo dicas sobre "como arranjar um marido rico". Como o jornalista não soube se a signatária da mensagem estava ironizando ou falando sério, não querendo correr o risco, ele respondeu a sua solicitação. Eis a carta da jovem moça: "Sou uma garota linda - maravilhosamente linda - de 25 anos. Sou bem articulada e tenho classe. Estou querendo me casar com alguém bem rico. Já namorei homens que ganham por volta de US$ 200 a 250 mil, mas não consigo passar disso. E US$ 250 mil por ano não vão me fazer morar em Central Park West. Então, qual a estratégia correta para me casar com alguém que ganha pelo menos US$ 500 mil por ano? Talvez você, querido leitor, possa estar surpreso. Talvez você, querida leitora, possa estar revoltada, mas esse fato é real. Em resposta a essa direta questão, o editor do jornal também foi direto. Depois de ler a consulta da leitora com grande interesse, pensou cuidadosamente no seu caso e fez uma análise da situação. Philip Stephens foi taxativo: “Visto da perspectiva de um homem como eu (que tenho os requisitos que você procura), o que você oferece é simplesmente um péssimo negócio”. Na sequência, o jornalista explicou que deixando as firulas de lado, o que a leitora estava sugerindo era uma negociação simples, proposta clara, sem entrelinhas: “Você entra com sua beleza física e eu entro com o dinheiro”, lembrou. Como se não bastasse, ele disse que tinha “mais um problema.” Com toda certeza, “com o tempo a sua beleza vai diminuir e um dia acabar, ao contrário do meu dinheiro que, com o tempo, continuará aumentando”. Debatendo este tema emocional no campo da razão, local este trazido pela própria leitora, o economista continua expondo argumentos racionais para o “negócio”. “Em termos econômicos, você é um ativo sofrendo depreciação e eu sou um ativo rendendo dividendos. E você não somente sofre depreciação, mas sofre uma depreciação progressiva, ou seja, sempre aumenta!” Com medo dela não entender, ele explicou: “Você tem 25 anos hoje e deve continuar linda pelos próximos 5 ou 10 anos, mas sempre um pouco menos a cada ano. E no futuro, quando você se comparar com uma foto de hoje, verá que o tempo passou. Isto é, hoje você está em 'alta', na época ideal de ser vendida, mas não de ser comprada”. Usando o linguajar de Wall Street, expôs ele, quem a tiver hoje deve mantê-la como 'trading position' (posição para comercializar) e não como 'buy and hold' (compre e retenha), que é para o que você se oferece. Portanto, começa a finalizar o economista Philip Stephens, editor do Financial Time, ainda, em termos comerciais, casar (que é um 'buy and hold') com você não é um bom negócio a médio/longo prazo! Mas alugá-la, sim! E a saída veio como óbvia: “Em termos sociais, um negócio razoável a se cogitar é namorar”, sugere ele. Queridos leitores, algumas pessoas tratam das emoções pelo campo da razão e matematizam tudo, ou seja, tudo passa a ser números: uma noite de amor com a pessoa amada custará um anel, um final de semana com a família vale outro livre dela, um beijo corresponde a ter o prato predileto na refeição seguinte, comprar flores terá em troca um abraço. Esse frenético estímulo-resposta do comportamentalismo chega ao ponto de algumas relações acabarem mediante a seguinte argumentação: “Eu dei mais abraços, eu dei mais beijos, eu dei mais amor e recebi em troca muito menos do que doei”. É assim como algumas pessoas veem as relações. E para você, relacionamento é um negócio? Por: Beto Colombo

segunda-feira, 2 de julho de 2012

O DISCURSO INDESEJÁVEL

Texto sobre comunicação e liderança, escrito por André Topanotti, especialisata em RH e pós-graduando em Filosofia clínica. Boa leitura.

Aloysio Tiscoski

Nos dias de hoje e ao estudar a historia, percebo que uma das características marcantes dos maiores lideres é seu grande poder e habilidade de comunicação. James Hunter define liderança como a capacidade de um determinado individuo de influenciar pessoas e alcançar resultados positivos junto a elas. Em minha opinião é importante que pessoas públicas, lideres empresariais, gestores, ou seja, qualquer individuo que exerça algum tipo de liderança sobre pessoas tenha a consciência que para o liderado, tudo que seu líder diz, fala e faz, representa muito mais do que ele imagina, e terá uma repercussão muito maior do que sua intenção, porque tal ação parte do líder, não de um par comum, e do ‘comandante’ exige-se muito mais do que os ‘comuns’. Penso que algumas figuras publicas, desde políticos ate atores de TV e jogadores de futebol, deve-se também incluir neste publico. Alguns destes reclamam que são muito criticados quando erram. Acredito que este é o preço, a contrapartida natural pela posição destacada a que este consegue ocupar na sociedade. Alguns líderes acham que precisam fazer discursos emocionados para agradecer seus liderados, enquanto para uma boa parcela dos profissionais às vezes um gesto de 'OK' e um sorriso apenas bastaria para que ela entendesse que seu 'chefe' gostou do seu trabalho. 

Deixe-me dizer por que estou trazendo este assunto hoje: Certo dia pela manhã estava ouvindo um programa matinal de uma importante radio da região e ouvi a entrevista de um renomado empresário sobre um dos empreendimentos de sua empresa. Explicando sobre os benefícios deste empreendimento no local onde o mesmo foi instalado. Disse o empresário: 'Nossa empresa, com este empreendimento também ajudou a tirar daquele lugar, pessoas não convenientes à sociedade. ' A expressão se deve em função de que aquele lugar, antes abandonado era usado por dependentes de drogas, e trazia insegurança à vizinhança do local, que agora estava satisfeita com a entrega deste empreendimento. Porém o termo e a forma como foi dita pelo empresário me chocou tanto que foi como se saísse do radio uma mão e me desse um tapa no rosto, me acordando de fato naquela hora meio sonolenta do dia. Impressionou não só a mim, tanto que alguns colegas me questionaram se também tinha ouvido esta entrevista. Nestas situações às vezes, pela falta de habilidade no trato das palavras, ou pela própria falta de planejamento do que se pretende dizer em público e de algumas expressões mal colocadas, podem render ao líder criticas desnecessárias. Sobre as 'pessoas indesejadas pela sociedade' por exemplo, penso que estas são antes de qualquer coisa produto desta mesma 'maravilhosa' sociedade que repudia e faz vistas grossas, jogando para baixo do tapete tais problemas sociais. Mas este não e o tema principal deste texto. 

Acredito que a preparação e preocupação de um líder, gestor ou empresário de como se comunicar com sua equipe, ou em publico é de suma importância. Um bom planejamento do discurso e também o ajuste de termos e colocações, adequados ao publico que ouvirá a mensagem, é algo que podemos exercitar de forma pratica no dia a dia. Se o líder tem fluência e eloquência reconhecida, do mesmo modo, muito cuidado. Basta lembrar-se das diversas gafes que nosso ex-presidente deixou na sua historia de discursos, e comparar com o atual desempenho da nossa presidente ao microfone. Longe de compara-los enquanto pessoas, mas do ponto de vista de preparação para seus pronunciamentos, a 'dona' Dilma esta dando aula para Lula. Alguns minutos de preparação, uma breve redação, ou ate mesmo uma lista de assuntos ou roteiro a seguir são ações ‘legais’ de se realizar para se comunicar de forma adequada. Para os mais perfeccionistas (como eu), quem sabe até ensaiar na frente do espelho. Sem risos, combinado?! Bem, para mim funciona e vale a pena se preparar do que comunicar o indesejável. 

 Paz, força e coragem amigos! 

 Por André Topanotti -

domingo, 1 de julho de 2012

CRISTIANISMO E CATOLICISMO

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística(IBGE) divulga que a Igreja Católica teve redução de 1,7 milhão de fiéis, uma redução de 12,2%. De 1970 para 2010 a redução de católicos brasileiros, foi de 91.8% para 64,6%. 

Na contramão, os evangélicos crescem e no mesmo período subiu de 5,2% para 22,2% O aumento desse segmento foi puxado pelos pentecostais, que se disseminaram pelo país na esteira das migrações internas. A população que se deslocou era, predominantemente de pobres que se instalaram nas periferias das grandes cidades. Com fraca presença da igreja católica nestes locais, as igrejas pentecostais se aproveitaram da situação e construíram suas igrejas e tiveram a preferência desta população. 

Previsão dos demógrafos é o fim da maioria católica no Brasil a partir de 2030. Como isto é apenas uma previsão com base na evolução recente, tudo pode ser diferente. 

O que é ser católico? É ser batizado? Ir à missa? Levar os filhos na catequese? 

Católico, significa universal. 

Ser católico poderia ser todo aquele que assim se declara? Esta é sim a definição sociológica dada pelos pesquisadores. 

A culta Europa tem como católicos, segundo pesquisa da própria Igreja Católica, apenas 25% de sua população. 

Como sempre ocorre quando de trata da história, o passado nos ajuda a entender o presente, nos leva a compreender os desafios contemporâneos que a Igreja Católica e o catolicismo enfrentam. 

O cristianismo se originou a 2 mil anos como uma seita judaica marcada por uma obsessão: o fim do mundo e o julgamento final dos homens, o apocalipse, que é também o título do último livro do chamado Novo Testamento. A Palestina judaica de então era uma colcha de retalhos de movimentos políticos e religiosos com tendências beligerantes e fanáticas. A grande maioria dos judeus recusava o carpinteiro Jesus como Messias, por ter fracassado em realizar a esperada libertação do seu povo do domínio romano. 

Grande polêmica ao redor da cristologia é sobre quem é Cristo? Homem? Deus? Homem e Deus? Como se relacionam nele essas duas naturezas, a divina e humana. Onde termina uma e começa a outra? Quando Jesus chora no jardim da oliveiras ou se desespera na cruz, é o homem ou Deus? Como pode Deus agonizar? São questões de grande profundidade que esta identidade teológica de Jesus impõe para pensarmos os desafios do catolicismo na atualidade. 

Qual o impacto disso no necessário diálogo inter-religioso, bem como nas próprias polêmicas internas do catolicismo romano? As controvérsias históricas e teológicas são infindáveis, e o número de documentos e suas interpretações são mais que um oceano de possibilidades. 

Quem eram os primeiros cristãos? Judeus pobres, em sua maioria. Em seguida judeus helenizados e romanizados, já de maior poder aquisitivo. 200 anos após, o cristianismo era uma religião dos povos mediterrâneos, helenizados e romanizados, agora já atingido camadas sociais mas abastadas. 

Eruditos cristãos que dominavam o grego e o latim realizaram a fusão entre uma seita judaica primordial e o que veio a ser, um corpo cultural razoavelmente sólido e dominante no Império Romano e no ocidente medieval. A tradição filosófica grega foi assimilada, tal como a ideia da alma, psicologia, política, ética e moral, entre outros. 

O Cristianismo nunca foi em sua história uma unidade. Sempre houve, assim como hoje, várias formas de cristianismo, sendo o catolicismo romano, assim como conhecemos, apenas uma delas, embora a mais importante e com maior número de seguidores, com grande importância simbólica e histórica. Se o cristianismo nunca foi um só, nos dias atuais vemos que esta multiplicidade de denominações cristãs esta amplificada. Entre os exemplos mais significativos, podemos citar os seguintes: catolicismo romano, ortodoxia bizantina, protestantismo histórico, pentecostalismo, neopentecostalismo, testemunhas de Jeová, o espiritismo de origem kardecista e a umbanda caracterizado pelo sincretismo religioso. 

Historicamente, teologia e política sempre estiveram unidas, como quando da permissão do culto da religião cristã no império romano pelo imperador Constantino no inicio do século IV , e quando dá oficialização do cristianismo pelo imperador Teodósio já ao final do mesmo século. 

De sua raiz judaica o cristianismo trouxe uma marca que será bem importante para o catolicismo do final do século XX, que é a crítica ética, social e política. A vocação de crítica ética e política, também chamada de profetismo hebraico, ao encontrar as utopias políticas modernas, descendentes de Jean-Jacques Rousseau e karl Marx, geraram um dos fenômenos teológicos mais importantes da história do catolicismo romano da segunda metade do século XX, a Teologia da Libertação. 

O domínio da Igreja Católica na Europa ocidental entre os séculos V e XV é quase pleno. A idade média, mais conhecida como a idade das trevas, mito este criado pelos iluministas franceses do século XVIII. A idade média é essencial na história do catolicismo porque nela a Igreja Católica quase realizou sua vocação de herdeira do espólio do Império Romano, para legislar sobre toda a Europa. 

Além das pressões internas e externas com o crescimento do islamismo e das cruzadas, o renascimento, movimento iniciado na Itália, esta tendência levou ao racha protestante com Lutero e Calvino. Lutero foi protagonista de um fenômeno que marcou definitivamente a história do cristianismo, com a quebra da unidade ocidental e a perda definitiva de Roma sobre todo o ambiente cristão. Este também foi o evento que dá inicio a separação da Igreja e do Estado, daí a expressão Estado laico. 

É comum dizer que a ciência a partir do século XVII matou Deus. Isto nada tem de científico. Deus não é uma variável passível de ser testada em laboratório. O que a ciência fez foi dar ao homem um método para construir teorias sobre o mundo que fossem passíveis de alguma medida, de teste em laboratório. 

A partir das teorias de Renê Descartes, a ciência avançou muito e uma vida racional acaba assumindo contornos de um confronto crescente entre verdades religiosas e verdades científicas, republicanas e democráticas. O próprio crescimento das sociedades modernas e sua multiplicidade cultural e religiosas, dentro do convívio republicano, fará surgir uma série de impasses que o catolicismo romano terá de enfrentar nos dias atuais. 

O movimento conservador vê na religião um fato essencial da vida psicológica e social, sem o qual a moral entraria em decadência, segundo estes. Esta defesa poderia ser religiosa em si ou apenas estratégica, tendo a religião como aliada necessária na defesa do tecido moral e político de uma sociedade em vias de destruição pelo processo modernizador. 

A modernidade é muitas vezes vivida como um trauma histórico, cheio de emoções, amor e ódio. Época inaugurada pelas revoluções sociais, pelo protestantismo, pela ciência e pelo secularismo, o que resume as agonias do catolicismo desde então: perda da hegemonia da cultura cristã, perda do monopólio da verdade para a ciência, perda do poder público para o estado laico. Estas são as agonias de toda a cultura ocidental que é judaico-greco-romana. 

Na filosofia, é sabido que as religiões sempre tiveram papel preponderante naquilo que os povos compreendem como fundamento dos valores morais. Religiões são definidas como sistemas de sentido para a vida das pessoas neste mundo e no mundo vindouro que elas acreditam existir. 

Originalmente moral e ética são sinônimos. Com o tempo a moral acabou por constituir-se no estudo dos hábitos e costumes, e a ética passou a designar a disciplina filosófica específica que busca estabelecer as normas para esses comportamentos de modo reflexivo e racional. 

A ciência e sua filha a tecnologia se aceleram constantemente e a igreja católica com sua hierarquia rígida é marcada por uma grande lentidão decisória. Enquanto isto as igrejas pentecostais são ágeis, bastando encontrar um espaço abandonado, uma bíblia e alguém que fale bem, microfone e algumas cadeiras, para abrir uma nova igreja, via de regra nas periferias onde a igreja católica está ausente. 

Enquanto a Igreja Católica se perdeu numa pastoral política, os pentecostais trabalham o cotidiano concreto da vida das pessoas, onde ter casa própria, casamento estável, dinheiro, emprego etc. são resumidas na formula da abundância de bênçãos. Max Weber imortalizou essa ideia na relação que fez entre espírito do capitalismo e burguesia protestante do norte europeu em sua obra clássica A Ética protestante e o espírito do capitalismo. 

Seria o fato de o Brasil ter predominância de pobres e iletrados que leva a ganhos pastorais de propostas como estas? 

A filha da ciência, a tecnologia, trás através das redes sociais e a comunicação rápida entre os jovens, desafios e oportunidades adicionais a todas as correntes religiosas, somando-se ainda temas como homossexualidade, novos modelos de família, ambientalismo e sustentabilidade. 

O que podemos dizer é que o catolicismo, apesar de todos os desafios, permanece sendo uma das denominações cristãs de maior apelo como sistema cotidiano de sentido, e eternidade. Tem ainda uma enorme elasticidade e capacidade de adaptação às transformações históricas, mesmo depois de muita gente afirmar sua morte, sucumbindo às ideias de Freud, Nietzsche, Marx e Darwin. A igreja tem a seu favor 2 mil anos de experiência com a psicologia do humano e suas mazelas, através da observação empírica e do enfrentamento delas. 

O foco de sua atenção tem sido identificar no que a modernidade fracassaria como agente doador de sentido para homens e mulheres contemporâneos. 

O catolicismo continua a encantar muita gente.

Por: Aloysio Tiscoski

SOBRE SEXO E CEREJAS

Homossexualismo tem cura? Esta parece ser a grande discussão nacional, nestes dias em que a Câmara debate em Brasília se psicólogos podem ou não oferecer tratamento para a homossexualidade. Na berlinda, projeto de decreto legislativo do deputado João Campos (PSDB-GO), da bancada evangélica, que pretende rever resolução do Conselho Federal de Psicologia que proíbe que psicólogos emitam opiniões públicas ou tratem a homossexualidade como um transtorno. 

Proponho outra pergunta: gostar de cerejas tem cura? Claro que evangélicos jamais porão em cheque o apreço por cerejas. Mas se encarniçam contra um outro prazer bem mais intenso que o de comer cerejas. Ainda há pouco, eu manifestava meu espanto com essa obsessiva preocupação que têm certas culturas em determinar como as pessoas devem se comportar na cama. Se não há violência nem desrespeito ao parceiro, que cada um se divirta como melhor lhe apraz e boa sorte a todos. 

Em meus dias de Folha de São Paulo, quando escrevi um artigo abordando a possível homossexualidade de Cristo – e por que não? Se os evangelhos nada dizem sonbre sua sexualidade, qualquer hipótese é permissível. Assexuado é que não deveria ser – recebi telefonema de um pastor, perguntando se eu não estava precisando de cura. Disse-me que tinha uma casa que abrigavam muitos ex-homossexuais. Ora, pastor, confesso que jamais vi um destes seres de perto. Entendo que uma pessoa possa ser ex-marido, ex-sacerdote, ex-comunista. Mas por que ser ex-homossexual? Se era, a prática lhe era prazerosa. E se lhe trazia prazeres, por que a ela renunciar? 

Quando se pergunta se homossexualismo tem cura, claro está que se fala em doença. Durante séculos, exceto em algumas culturas pagãs, este comportamento foi visto como perversão ou doença, e só em 1973 a homossexualidade deixou de ser classificada como tal pela Associação Americana de Psiquiatria. Em 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da sua lista de doenças mentais. Em 1991, a Anistia Internacional passou a considerar a discriminação contra homossexuais uma violação aos direitos humanos. 

No Brasil, a Associação Brasileira de Psiquiatria considerou, em 84, a considerou a homossexualidade como algo não prejudicial à sociedade. No que foi seguida, no ano seguinte, pelo Conselho Federal de Psicologia, que acabou estabelecendo mais tarde regras para a atuação dos psicólogos em relação às questões de orientação sexual. Considerou-se então que a homossexualidade não constitui doença, nem distúrbio, nem perversão e que os psicólogos não colaborarão com eventos e serviços que proponham tratamento e/ou cura da homossexualidade. E aqui reside o nó górdio da questão. Os evangélicos querem permitir que psicólogos tratem a homossexualidade de clientes. A militância gay vê nesta atitude preconceito. 

Quinta-feira passada, 28 de junho, quando ocorreram os debates em Brasília, foi proclamado o Dia Mundial do Orgulho Gay. Para o deputado João Campos, a resolução do CFP veda que o psicólogo atenda o homossexual que queira se tratar, como se esse paciente fosse um cidadão menor. Ora, por que um cidadão desejaria tratar-se de algo que lhe é prazeroso? Só mesmo por razões religiosas, que vêm no homossexualismo um pecado e incutem no homossexual sentimentos de culpa. Azar de quem é suficientemente pobre de espírito para cair na armadilha dos religiosos. 

Conheço e convivi com homossexuais durante toda minha caminhada. Eles estão a nosso lado, em praticamente todas as circunstâncias da vida, escola, universidade, trabalho ou lazer. Fiz meu ginásio no início dos anos 60, em Dom Pedrito, pequena cidade fronteiriça, que teria na época uns 13 mil habitantes. Em minha classe havia pelo menos três homossexuais, que me acompanharam durante quatro anos. Muito antes que a Associação Americana de Psiquiatria deixasse de classificar homossexualismo como doença, muito antes de a OMS ter retirado a homossexualidade da sua lista de doenças mentais, não víamos neles nada demais, a não ser uma opção sexual distinta. Claro que alguma piada rolava, mas jamais foram discriminados. 

Dom Pedrito – já contei – foi o berço de Rui Bastide, líder político local, voz de estentor, bom de voto e temível nos debates, que jamais escondeu suas preferências por jovens efebos. Nem por isso deixava de contar com o apreço dos pedritenses. Isso há meio século atrás. 

Alto, apolíneo no porte, dionisíaco na vida, Rui Bastide foi eleito e reeleito vereador várias vezes e chegou a ser prefeito da cidade. Nos anos 70, teve seus direitos políticos cassados, por um ato único do presidente Garrastazu Médici. Honrado com a deferência, comemorou o ato com foguetes. Comentário indiferente na cidade: "O Brasil vai perder muito com esta cassação". Na época, não se falava em gays, tampouco havia associações de gays e lésbicas. "Já procurei até médico" - confessou-me um dia Bastide -. "Mas que vou fazer? É a minha natureza." Em tempo: Brasil era um negrão que fazia jus aos favores do futuro alcaide. 

A trajetória do Rui, a meu ver, está à espera de um bom cineasta. Em passadas andanças pela Europa, em vários países relatei este caso pedritense. E vi alemães, franceses, espanhóis perplexos, admitindo que em suas comunidades, por mais abertas que fossem aos novos tempos, não haveria lugar para um prefeito gay. Fala-se muito hoje em abrir o jogo, sair do armário, assumir-se. Tais expressões eram desconhecidas em Dom Pedrito. Se alguém era homossexual, ninguém tinha nada a ver com isso e estamos conversados. 

Para quem se criou em meio a este ambiente de tolerância, causa espécie que hoje, 50 anos depois, esteja se debatendo na capital do país se a prática é ou não doença. Segundo o presidente do Conselho Federal de Psicologia, Humberto Verona, o profissional que insistir em tratar homossexualidade sofrerá processo ético. Em entrevista à Folha de São Paulo, diz o psicólogo: “A homossexualidade não é doença, não é um distúrbio. É proibido ao psicólogo oferecer tratamento e cura. O psicólogo que entender que é uma doença pode sofrer um processo”. 

Em meio a isto, entra na dança a psicóloga evangélica Marisa Lobo, que explica porque é contra a resolução. Interrogada se é possível tratar a homossexualidade, responde: “É possível atender o sofrimento psíquico, eu não falo em tratamento. É possível uma pessoa buscar ajuda psicológica para mudar sua opção ou orientação. Não estou tendo preconceito. Homossexual que se aceita tem mais é que ser feliz do jeito que ele escolheu, e que lhe sejam garantidos todos os direitos. Mas e esses que procuram ajuda, que não se aceitam?” 

Marisa Lobo, que se apresenta como “psicóloga cristã”, está sendo ameaçada de ter seu registro profissional cassado caso não negue sua fé. O Conselho Federal de Psicologia acatou denúncia contra a psicóloga por divulgar isto nas redes sociais, assim como nas palestras em que participa. Para evitar a cassação, deveria retirar de seus perfis nas mídias sociais toda e qualquer menção à sua fé, ou parar de exercer a profissão. 

Há exageros de parte a parte. Por um lado, nenhum religioso pode impor a uma sociedade laica sua visão de mundo. Se quiser impô-la a seu rebanho, sinta-se à vontade. Por outro lado, se existem até médicos católicos e juízes espíritas, por que uma psicóloga não pode se dizer cristã? De minha parte, acho que quem crê na Santíssima Trindade, na ressurreição do Cristo e na virgindade de Maria, não pode sequer participar de uma banca de doutorado. Mas eu sou teu e isso é apenas meu modo de ver a coisa. Conheço doutores crentes que continuam julgando teses, que se pretendem científicas, e nem por isso o mundo vem abaixo. 

Que mais não seja, se alguém descobriu algo de perverso nas cerejas e quer ajuda para evitá-las, não vejo porque negá-la. O azar é dele. -  Por: Janer Cristaldo

EXPECTATIVA DE VIDA NO BRASIL


Expectativa de vida sobe 25,4 anos de 1960 a 2010, diz IBGE

A expectativa de vida do brasileiro aumentou 25,4 anos de 1960 a 2010, ao passar de uma média de 48 anos para 73,4 anos. A esperança de vida do Censo 2010 já havia sido divulgada em dezembro, mas a comparação da evolução em 50 anos foi feita hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no anúncio de novos recortes de dados da pesquisa.
Com o brasileiro vivendo mais, o governo ainda não desistiu de impor uma idade mínima para as aposentadorias ligadas ao INSS. Em reunião com os líderes de partidos da base no Ministério da Fazenda, interlocutores do governo pediram prazo até o dia 10 de julho para apresentar uma proposta em substituição ao fim do fator previdenciário. 
A rodada de negociação foi provocada pela decisão do presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), anunciada aos líderes de por o tema no plenário na próxima semana. Os deputados querem votar o projeto que acaba com o fator previdenciário e institui a regra apelidada de 85/95. Essa proposta tem o apoio das centrais sindicais. Por essa fórmula, para se aposentar com o teto do benefício, a soma da idade e do tempo trabalhado deve chegar a 85 anos, no caso de mulheres, e 95 anos, se homem. 
O fator previdenciário é o mecanismo usado para definir o valor do benefício que leva em conta o tempo de contribuição, a idade e a expectativa de vida do trabalhador. A regra faz com que os trabalhadores se aposentem mais tarde para obter o teto da aposentadoria. Na rodada de conversa desta quarta, o governo ponderou sobre a necessidade de instituir uma idade mínima para aposentadoria para valer no futuro, não atingindo os trabalhadores que já estão no mercado, e uma atualização periódica da regra 85/95.




Previdência privada


Outro fator que merece atenção do contribuinte é a situação dos fundos de previdência privada no atual cenário de redução dos juros. Com a taxa básica de juros, a Selic, em 8,5% ao ano, os especialistas são céticos em dizer que dificilmente será possível um plano render juro real (juro descontada a inflação) de 6% ao ano, como o brasileiro estava acostumado.

Enquanto isso, órgãos reguladores discutem criar novos produtos no mercado. A tendência do juro, segundo a opinião do mercado financeiro na pesquisa Focus do Banco Central, é só de queda.