quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

GRANDES QUESTÕES

Uma sociedade que deixa de se questionar sobre o sentido profundo das coisas está fadada ao retrocesso


Nos últimos 400 anos, milhares de homens e mulheres usaram o método científico para construir um corpo de conhecimento único que transformou a humanidade. Baseado na formulação de hipóteses e nos seus testes empíricos, o método oferece um processo de construção progressiva, em que descrições cada vez mais abrangentes dos fenômenos naturais são obtidas.

Da física de Newton, que descreve a gravidade como uma ação à distância entre corpos com massa, à relatividade de Einstein, que descreve a gravidade como resultado da curvatura do espaço em torno de objetos com massa, uma quantidade cada vez maior de fenômenos naturais foi compreendida.

O mesmo ocorre com a mecânica newtoniana e sua extensão para a mecânica quântica, que descreve os átomos e suas partículas. Ou da biologia com Darwin e a subsequente revolução na genética. Dessa compreensão e de suas aplicações vem a tecnologia, parte indissolúvel de nossas vidas.

Esse acúmulo de conhecimento não ocorreu ao acaso. Ideias, por mais belas e convincentes que possam parecer, só se tornam parte do corpo de conhecimento científico após serem testadas no laboratório.

Mais precisamente, uma teoria só é aceita enquanto não for provada errada ou incompleta. Não existem explicações finais; apenas descrições satisfatórias dentro do que podemos testar. Com o avanço da tecnologia, esses testes tornam-se cada vez mais refinados. É justamente dessa maior precisão que falhas nas teorias aceitas podem surgir. Sem o constante refinamento das tecnologias usadas, ficamos sem meios de testar novas ideias. E o avanço do conhecimento estagna.

Essa é uma preocupação constante dos cientistas, especialmente daqueles cujas ideias e teorias envolvem testes que empregam tecnologias avançadas e, em geral, caras. Quem não fica maravilhado com as imagens espetaculares de galáxias e nebulosas distantes do Telescópio Espacial Hubble ou de um dos telescópios gigantes no topo de montanhas no Havaí e no Chile? E a descoberta do bóson de Higgs, a tal "partícula de Deus"?

Galáxias a 10 bilhões de anos-luz ou partículas subatômicas que existem por menos de um bilionésimo de segundo parecem ser realidades distantes do nosso dia a dia, com contas a pagar, trânsito, questões sociais e políticas diversas. Há quem diga que são essas as questões fundamentais, que investir no conhecimento mais abstrato é perda de tempo e de insumos fiscais.

Não há dúvida de que problemas sociais e políticos precisam de nossa atenção. Não há dúvida também de que projetos científicos de larga escala são caros. Porém, a resposta não precisa ser "isso ou aquilo". Não precisa e não deve.

Se deixarmos de questionar o sentido profundo das coisas e nos dedicarmos apenas ao imediato, abandonaremos um dos aspectos mais nobres da humanidade: a necessidade de nos questionar sobre o mundo, sobre nosso papel nele e nossas origens. Deixaremos de construir pontes entre as várias vertentes do conhecimento, que enriquecem nossa visão de mundo. Uma sociedade que deixa de se indagar sobre as grandes questões está fadada ao retrocesso. O espírito humano precisa do novo para crescer. Por: Marcelo Gleiser Folha de SP

ESPREMIDO NO AVIÃO

Em quantos voos o pobre homem não teria notado a rejeição na face de idiotas como este que vos escreve

Sofro para encaixar as pernas nos aviões atuais. Se as deixo juntas, meus joelhos ficam prensados contra as costas do banco da frente; quando tento abri-las, incomodo quem está ao meu lado.

Num voo para Manaus, o único lugar que consegui foi na fileira do meio. Na janela, estava um rapaz de camiseta e boné, com as pernas maiores do que as minhas.

Enquanto meus companheiros de infortúnio entravam em fila ordenada e arrumavam seus pertences nos bagageiros, só não rezei para que o banco à minha direita permanecesse vazio porque não compreendo como os crédulos podem imaginar a existência de um ser superior com discernimento, perspicácia e tempo livre para as pequenas desventuras de cada um dos 7 bilhões de seres humanos espalhados pelo planeta.

Quando vislumbrei na fila um passageiro com mais de cem quilos, tremi nas bases. Não sei se você, leitor, é menos azarado, mas a meu lado jamais senta uma mulher bonita e agradável. No embarque, quando vejo alguma com tais atributos, tenho certeza absoluta de que a meu lado não ficará.

Como estava no fundo do avião, a esperança de que meu viçoso companheiro de viagem encontrasse seu assento mais à frente só me abandonou quando ele parou sorridente:

- Lamento, mas você foi sorteado para sofrer esse aperto junto comigo, nas próximas três horas e quarenta e cinco minutos.

A simpatia foi uma punhalada em meu coração. Para chegar se desculpando daquele jeito, em quantos voos o pobre homem não teria notado a rejeição estampada na face de idiotas como este que vos escreve.

Apesar da culpa, reconheci que não seria fácil viajar entre o rapaz de boné, com uma das pernas invadindo o espaço microscópico teoricamente reservado para mim, e o passageiro de corpo avantajado, que me forçava a manter encolhidos o braço e o ombro.

Entre os dois, onde apoiar o computador para terminar o trabalho? Situação pior, só a do cidadão à minha direita, com o corpo que transbordava os limites da poltrona.

Com muita dificuldade, consegui acomodar o computador no colo, numa posição desajeitada que me permitia enxergar a tela e tocar no teclado, contanto que permanecesse imóvel.

Às tantas, meu vizinho transbordante me cutucou:

- Acabei de ler esse seu livro, "Carcereiros". Você devia escrever sobre os spas.

- Spa?

- Porque os spas são iguais às cadeias.

Ele havia ganhado mais de 30 quilos nas últimas décadas. Preocupados, a esposa e os filhos insistiram durante anos para que se internasse num spa. Diante da resistência do principal interessado, planejaram uma chantagem terrível: não levariam mais os netos para ver o avô.

- Quando me deixaram na porta do spa com a malinha, senti que nunca mais recuperaria a liberdade. Deu vontade de chorar.

A rotina diária confirmou suas piores expectativas:

- No almoço, cem gramas de frango grelhado, meia cenoura cozida e duas folhas de alface. No jantar, um caldo tão ralo que nem a sede matava. De manhã, um pedacinho de mamão, uma fatia de pão de forma com requeijão com gosto de isopor e uma xícara de chá.

Depois do café, caminhada ao ar livre e uma hora de hidroginástica. À tarde, exercícios na academia. No terceiro dia, sentiu o organismo fraquejar; no quarto, simulou um quadro gripal para passar o dia na cama. Em uma semana, perdeu três quilos, mas ficou revoltado.

Tinha vivido na pobreza extrema quando criança. Trabalhar até ficar bem de vida para passar fome novamente não fazia sentido para ele.

Nesse estado de espírito, perguntou para o guarda da noite quem vendia os melhores salgadinhos da cidade. O rapaz lhe disse que vinha gente de longe atrás das empadas de palmito e coxinhas de frango com catupiry que uma senhora fazia. Meu vizinho de poltrona não se fez de rogado:

- Subornei o guarda para me trazer meia dúzia de cada.

Nos dias seguintes cometeu uma imprudência, no entanto:

- Caí na besteira de oferecer para outro gordo que também passava mal de tanta fome.

Infelizmente, o companheiro não respeitou o sigilo combinado:

- Começou uma romaria noturna no meu quarto. Precisei comprar duas dúzias por dia. Vinha tanta gente que fui obrigado a pregar um aviso na porta: "Depois das 23 horas, não atendo mais ninguém". Por: Dráuzio Varela Folha de SP

quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

OS ALIMENTOS MAIS CONTAMINADOS POR AGROTÓXICOS

Lembre-se, o produtor quer dinheiro no bolso, não está nem um pouco preocupado com a saúde de quem come aquilo que produz...

Se você se deixar levar pela aparência bonita e brilhante dos alimentos, está perdido

A Agência Nacional de Vigilância Sanitária(Anvisa), analisou 2.488 amostras de 18 vegetais, das quais 28% estavam insatisfatórias para o consumo.

O Levantamento:No caso do levantamento da Anvisa, os "organofosforados" - substâncias que podem destruir células musculares e comprometer o sistema nervoso, provocando problemas cardiorrespiratórios - estão presentes em mais da metade das amostras irregulares.

O relatório final do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos de Alimentos destaca que as doenças crônicas não transmissíveis – que têm os agrotóxicos entre seus agentes causadores – são hoje um problema mundial de saúde pública.

Segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde (OMS), elas são responsáveis por 63% das 57 milhões de mortes declaradas no mundo em 2008, e por 45,9% do volume global de doenças.

A OMS prevê um aumento de 15%, entre 2010 e 2020, dos óbitos causados por essas doenças. No Brasil, elas já representam a principal causa de óbito, sendo responsáveis por 74% das mortes ocorridas em 2008 (893.900 óbitos).

O mercado brasileiro de agrotóxicos é o maior do mundo, com 107 empresas aptas a registrar produtos, e representa 16% do mercado mundial. Somente em 2009, foram vendidas mais de 780 mil toneladas de produtos no país. Além disso, o Brasil também ocupa a sexta posição no ranking mundial de importação de agrotóxicos.


Os Alimentos mais Contaminados:O pimentão, o morango e o pepino lideram o ranking dos alimentos mais contaminados por pesticidas, em 2010 (veja lista completa ao lado), segundo levantamento da Anvisa. Os dois problemas detectados na análise de amostras foram o teor de resíduos de agrotóxicos acima do permitido e o uso de pesticidas não autorizados para as culturas.


Tabela da Anvisa com os índices de contaminação dos alimentos

Os agrotóxicos são a segunda causa de intoxicação no país, ficando atrás apenas dos medicamentos.

No caso do pimentão, 91,8% das amostras analisadas apresentaram problemas contaminação. No morango e no pepino, o percentual de amostras irregulares foi de 63% e 58%, respectivamente.

A alface e a cenoura também apresentaram índices de contaminação elevados. Em 51,9% das amostras de alface e em 48,9% das amostras da cenoura foram encontradas irregularidades.

Já na beterraba, na couve e no mamão as irregularidades foram verificadas entre 20% a 30% das amostras analisadas.

Em 24,3% dos casos, o agrotóxico não era autorizado para uso na cultura analisada. Em 1,7% das amostras foram encontrados resíduos de agrotóxicos em níveis acima dos autorizados e, em 1,9% restantes, foram encontradas as duas irregularidades.

Em 2010, apenas 2,1% das amostras analisadas não tiveram qualquer rastreabilidade. Na maioria dos casos (61,2%), foi possível rastrear o alimento até o distribuidor.

Sem contaminação:A batata foi o único alimento analisado sem o registro de contaminação nas amostras. Em 2002, primeiro ano de monitoramento, 22,2% das amostras do alimento apresentavam irregularidades.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

LINCOLN, DE SPILBERG

Lincoln foi uma figura fáustica, um construtor de império que não hesitou em fazer o sacrifício de 600 mil vidas para esmagar as liberdades federativas originais, pondo em seu lugar um Estado mais centralizado, de vocação imperial.

O filme Lincoln, de Spielberg, é uma construção cinematográfica grandiosa, que dá ao expectador o efeito específico que só o cinema consegue: o impacto visual da reconstrução biográfica do grande presidente dos EUA. Além do notável diretor temos a ação dos grandes atores do elenco. Daniel Day-Lewis no papel principal equiparou-se agora aos maiores atores de todos os tempos, no nível de Al Pacino. Tudo que se escreveu sobre ele é merecido e quem vê o filme sai do cinema de queixo caído, admirado.

O foco da narrativa é as últimas semanas de vida de Lincoln e sua batalha parlamentar para aprovar a Décima Terceira Emenda, a que aboliu a escravatura. O diretor talvez pudesse abreviar essa narrativa e dar um pouco mais de dinamismo ao filme. Mesmo assim, sua escolha foi boa, para mostrar como é a mecânica da aprovação das leis, mesmo daquelas mais emblemáticas. No filme foi sublinhado que mesmo ele, o incorruptível Lincoln, passou a corromper para que a lei pudesse ser aprovada. Momentos de verdadeiro “mensalão”, como tivemos por aqui. Coisas da vida política.

O Daniel Day-Lewis captou a psicologia do personagem. A perfeição que conseguiu na reprodução do corpo e dos gestos (talvez da voz) de Lincoln é admirável. O rápido envelhecimento, a máscara dos últimos dias de vida, é evidência do desgaste da luta política, da administração da guerra e do drama familiar. Mas penso que é sobretudo resultado do esgotamento do tempo fáustico. Lincoln foi uma figura fáustica, um construtor de império que não hesitou em fazer o sacrifício de 600 mil vidas para esmagar as liberdades federativas originais, pondo em seu lugar um Estado mais centralizado, de vocação imperial.

Essa constatação nos leva necessariamente a meditar sobre a história norte-americana, de forte impacto nos acontecimentos globais, desde então. Com Lincoln, os EUA realizaram o esplendor do Estado moderno, guerreiro, expansionista, realizador. O papel desempenhado desde então por aquele país, em todos os conflitos relevantes, parece confirmar o destino manifesto. Tornou-se hegemônico. Suplantou a Europa. Virou policia do mundo. Explodiu a bomba atômica.

Muita gente vê os EUA como um Estado providencial. Penso ser um engano. É da mesma natureza que os demais Estados modernos. Se a história lhe reservou certos papéis mais moderadores foi por circunstância, pois ele nunca esteve dissociado nem da logica de movimento e nem dos propósitos dos demais Estados. O Estado moderno é sempre o devorador de homens, o matador em escala industrial. A guerra civil foi um momento conspícuo dessa jornada assassina.

Lincoln é a figura chave na construção do Estado norte-americano. Seu legado político fez sucumbir o idealismo daqueles que apostavam na federação de fato, na “federação de reinos autônomos”. No lugar das liberdades federativas temos a União centralizadora e determinadora das formas jurídicas e políticas do existir. No momento, a grande ameaça é o Estado mundial, desejado por muita gente, inclusive por Obama, mas não se sabe muito bem qual o formato que terá. Os que lutam pelo Estado mundial ainda não têm a fórmula de implantação, mas seguem o caminho necessário da homogeneização dos marcos jurídicos nacionais, passo a passo, e da implantação da agenda da nova moral, anticristã. A nova moral mundial.

Sem que Lincoln tivesse obtido seu êxito o mundo teria sido bem diferente no século XX e estaria bem diferente agora. Talvez as ameaças fossem menores, mas isso é tão impossível de saber quanto se contar a história do que poderia ter sido. Por: Nivaldo Cordeiro

TRANSFORME ALIMENTOS CONTAMINADOS EM ORGÂNICOS


Lembre-se, o produtor quer dinheiro no bolso, não está nem um pouco preocupado com a saúde de quem come aquilo que produz...

Se você se deixar levar pela aparência bonita e brilhante dos alimentos, está perdido

Que Cuidados Devemos Ter? A ingestão cotidiana de agrotóxico, já que todos atuam de forma cumulativa no organismo, está associada ao surgimento, comprovado, de doenças crônicas não transmissíveis, como desregulação endócrina, quadros degenerativos, alergias graves, outras patologias crônicas e Câncer.

Para reduzir o consumo de agrotóxicos em alimentos, o consumidor deve optar por produtos com origem identificada, o que aumenta o comprometimento dos produtores em relação à qualidade dos alimentos, com adoção de boas práticas agrícolas, ou então devem escolher produtos Orgânicos.

Fora isso, O Que mais podemos Fazer?Como não temos meios para rastrear a origem daquilo que consumimos, alguns cuidados devem ser tomados. Os procedimentos de lavagem e retirada de cascas e folhas externas de verduras também ajudam na redução dos resíduos de agrotóxicos e eliminação de microorganismos resistentes.

Em primeiro lugar o alimento NÃO deve ser lavado logo que chega do supermercado. Ocorre que, na temperatura ambiente o alimento tende a absorver a água da lavagem, já que o líquido está na mesma temperatura, trata-se de um fenômeno físico chamado Uptake, e isso acaba levando o veneno que estava na superfície ou casca para o interior do vegetal.

A melhor forma é deixá-lo na geladeira, acondicionados em recipientes fechados na parte baixa, do mesmo jeito que chegaram do supermercado ou feira, por duas horas, e só depois disso proceder a lavagem em água corrente. Para completar a limpeza, dilua uma colher de sopa de água sanitária para cada litro de água. Deixe de molho, aguarde cerca de 5 minutos, enxágüe e pronto. O Vinagre também pode ser usado para matar o resto dos microorganismos, mas, usando a água sanitária já basta.

Não esqueça de retirar aquelas partes cheias de dobras, onde o veneno se acumula e não dá para lavar. Alimentos com a casca comprometida ou mutilados, devem ser evitados, uma vez que o veneno já penetrou na parte interna.

As folhas, como alface, devem ficar de molho na solução acima por 30 minutos. Depois as folhas devem ser enxaguadas com água filtrada. Quando as folhas estiverem secas, a alface deve ser guardada em recipiente com tampa, e levada ao refrigerador. Tomates e batatas devem ficar fora da geladeira, para degradação dos pesticidas.

Transformando Alimentos Contaminados em Orgânicos! Você sabia disso, que isso é possível? Pois bem, vejamos como;

Compre na farmácia Tintura de Iodo à 2% e proceda da seguinte forma. Para cada litro de água misture aproximadamente 5ml da solução. Depois coloque dentro dessa água os legumes que deseja descontaminar.

Deixe em local protegido da Luz por aproximadamente 1 hora. Feito isso basta enxaguar e está pronto, alimentos com jeito de Orgânicos, livre de qualquer tipo de contaminação.

Conclusão:E para simplificar sua vida, prefira sempre alimentos Orgânicos de procedência conhecida e confiável.

Observação Importante:O site não se presta a fazer o papel do seu Médico ou Nutrólogo, nem de prescrever medicações de qualquer natureza, para qualquer tipo de patologia, mas apenas de servir como fonte de referência, para sua informação pessoal.
Fonte: http://www.mundosimples.com.br 


domingo, 27 de janeiro de 2013

O LEITE DE VACA E A SAÚDE HUMANA


JOGOS OLÍMPICOS GAY?

Acontece com arrepiante regularidade: entro numa livraria da Europa, vou farejando os livros disponíveis e encontro uma estante com "Literatura Gay". Mas o que será "Literatura Gay"?


Os livros respondem: é Oscar Wilde, Virginia Woolf, Truman Capote e dezenas, ou centenas, de outros autores cujos hábitos privados eu desconhecia. Mas que, pelos vistos, definem a identidade de uma obra.

A situação mais absurda aconteceu há uns anos, em Paris, quando perguntei pelos diários de André Gide publicados pela 'Pléiade'. Na minha ingenuidade, eu tinha procurado Gide entre os autores franceses.

A moça da livraria riu da minha inocência e, com olhar de desdém, informou-me que Gide estava na secção da "Literatura Gay". Logo a seguir a "Genet, Jean" e antes de "Proust, Marcel".

Existem duas formas de lidar com o problema. A primeira, mais imediata, é dinamitar uma livraria que comete aberrações destas.

A segunda, mais ponderada, é esclarecer com infinita paciência que a literatura não tem orientação sexual. Nem raça, nem credo, nem sequer "ideologia".

Oscar Wilde não é um escritor gay. É um escritor. James Baldwin não é um escritor negro (e gay). É um escritor. Evelyn Waugh não é um escritor católico. É um escritor. Céline não é um escritor fascista. É um escritor.

Claro que, na obra de cada um deles, as crenças pessoais e as práticas privadas podem encontrar tratamento literário superior. Mas é como literatura que cada um deles deve ser julgado - e classificado.

É tão absurdo encerrar um escritor nas estantes da "Literatura Gay" como, sei lá, definir Toulouse-Lautrec como um dos principais artistas na História da Arte Anã. Ou Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho de Minas, como um importante escultor na História da Arte Deficiente.

Valorizar uma obra, qualquer que ela seja, com a causa politicamente correta do momento, não é apenas um sintoma de analfabetismo. É um ato de vandalismo cultural.

E se assim é com a literatura, assim será com o desporto. Leio no "The Sunday Times" que Amsterdã, Londres e o Rio de Janeiro disputam uma vaga para organizarem os Jogos Olímpicos Gay em 2018.

Londres leva claríssima vantagem porque o "mayor" Boris Johnson, que eu tinha em boa conta, promete ceder o estádio Olímpico da cidade e outros equipamentos desportivos para que os atletas gays possam disputar as suas medalhas gay nas modalidades gay que fazem parte dos jogos gay.

Com a provável exceção da marcha atlética, eu não conheço nenhuma modalidade visivelmente gay. Não sei o que é o futebol gay, o boxe gay, a natação gay, o xadrez gay ou, minha nossa, o rodeio gay (palavra de honra).

Aliás, por falar em rodeio gay: será que o touro e o "cowboy" devem partilhar ambos a mesma orientação sexual para estarem em sintonia com o espírito da competição? Mistério.

Mistério e, já agora, um delírio que seria intolerável se alguém propusesse Jogos Olímpicos Heterossexuais. Ou Jogos Olímpicos Brancos. Ou Jogos Olímpicos Católicos, ou Judeus, ou Muçulmanos.

O que não deixa de ser irônico: em nome da igualdade, as patrulhas do "Orgulho Gay" defendem uma clamorosa forma de desigualdade. Em teoria, cultivam uma retórica de integração - e até aceitam a participação de qualquer sujeito nos jogos, independentemente da sua orientação sexual. Na prática, promovem na titulatura um tratamento distintivo muito próximo da segregação.

Combater o "preconceito" não passa por erguer novas bandeiras de singularidade. Pelo contrário: passa por derrubar as que existem, eliminando o adjetivo que acompanha o substantivo (obrigado, Gore Vidal).

Não há escritores gay. Há escritores. Não há atletas gay. Há atletas. Se o sujeito não apresenta nenhuma deficiência física ou mental, só deveriam existir uns Jogos Olímpicos para ele.

Quais? Os Jogos Olímpicos de toda a gente. Por: João Pereira Continho Folha de SP


sábado, 26 de janeiro de 2013

PAGÃOS

Um rapaz de 15 anos, abastado, inteligente e educado, me disse que pagar R$ 0,99 por uma música na internet era uma exploração sem precedentes.


Graças a um certo atraso geracional, vivo alheia às questões de direitos autorais das novas mídias, mas, dessa vez, me senti algo indignada. Rebati perguntando o porquê de ele achar correto o preço de uma barra de chocolate e se sentir tão ultrajado com o singelo custo da composição. Ele respondeu que não teria como arcar com as mais de 2.500 músicas arquivadas no seu drive.

Sugeri que quem possui um computador caríssimo, jeans custosíssimos, além de iPads, iTouches e afins na sua parafernália de entretenimento, tem, sim, condições de arcar com o ônus de uma canção.

Com a calma de quem vive uma realidade que eu desconheço, o infante me explicou que a internet dá ao artista a chance de divulgar seu trabalho e não há lógica em cobrar por uma oportunidade.

Um outro jovem, esse com tendências mais à esquerda do que o primeiro, completou aos brados que o verdadeiro artista não trabalha por dinheiro e lembrou que os pobres devem ter acesso à cultura tanto quanto os endinheirados. Essa alegação empurrou a discussão para o campo da insensibilidade social, emudecendo a velha guarda.

Os adultos só tiveram chance porque a babá de um dos imberbes se manifestou, afirmando que toda a vez que um rico quer defender o seu ponto de vista apela para o direito dos menos favorecidos. "Pobre não tem computador." Lembrou ela.

Animados com o apoio da classe trabalhadora, os de maior contra-atacaram dizendo que o que parecia cultura para todos não passava de uma apropriação indevida das grandes corporações que faturavam trilhões em cima do conteúdo de terceiros.

"E os milhões que os cantores acumulam nos shows?" Devolveram os adolescentes. "E o direito autoral dos compositores?!" Vociferaram os mais velhos. "Eles não entendem", concluíram os menores, como se os nascidos antes da virada do milênio fossem matusaléns sem cura, presos ao tempo em que era possível numerar o vinil, o livro ou o celuloide.

Um dos poucos antenados da segunda idade lembrou que Gilberto Gil, o mais apto membro da MPB a lidar com as novas diretrizes do mercado fonográfico, liberou parte de sua obra para ser "downloadada" de graça, ao mesmo tempo que protegeu o melhor de sua discografia da ferocidade da pirataria. Hipócrita! Bradou ultrajado o mais à esquerda dos pequenos.

A noite terminou em lágrimas, com os pais afrontados com as crias e os de menor aviltados pelo atraso das gerações pregressas.

Passei dias atormentada com a violência da ceia, pensando no quanto a arte perdeu terreno para a tecnologia. E assim entramos na Scuola di San Rocco, em Veneza, onde Tintoretto preencheu cada milímetro de parede do exuberante prédio renascentista com a sua extraordinária versão da Bíblia. E descemos a bota com os rebentos, arrastando-os por capelas cobertas por Giotto, Michelangelo, Da Vinci e Fra Angelico.

É impressionante como esse levante de artistas, bancados pela igreja e por "dodges" e príncipes alinhados com o Papa, conseguiram se superar diante de uma restrição temática tão acirrada. E tome madona, crucificação e santa ceia, ressurreição e batismo, manjedoura e Menino Jesus.

A arte sempre caminhou entre a marginalidade e o sistema. O século 20 foi o último a viver sobre a influência do humanismo, cuja explosão ocorreu lá, no renascimento. Hoje, vivemos um ateísmo tecnológico sem precedentes, tão bem representado pela indiferença do rapaz que despreza o conteúdo artístico e venera sua nave virtual.

Fiz essa viagem para apresentar às crianças o berço do Ocidente, que pode até ter sido a Grécia, mas que se desenvolveu à plena potência na Itália. Depois de uma via crucis por igrejas, notei o ar de vingança no rosto dos moleques ao adentrarem o Coliseu.

O sofrimento cristão é mesmo de uma melancolia sem fim, admirar o vigor das estátuas realistas de Trajano, Adriano e Marco Aurélio encoraja o espírito. Mas as novas gerações não se miram nem em Roma nem em Cristo, seu paganismo é de outra ordem.

O iPhone é a nova Pietá. Por: Fernanda Torres Folha de SP.


sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

A HISTÓRIA DO GRANDE RACIONAMENTO DE PALAVRAS

Conto de Tage Danielsson 

Tradução do sueco de Janer Cristaldo 

Um dia disse Nosso Senhor à sua mulher: 

- Ouve, Elvira, é algo absolutamente incrível o que os homens falam e falam sem parar. Acho que a situação piorou nos últimos tempos com tagarelices cada vez mais sem sentido. Para alguém como eu que tudo vê e tudo ouve, devo confessar que isso se torna um pouco irritante. 

- Não seja idiota, Karl-Ragnar - disse a mulher de Nosso Senhor -. Uma conversinha de quando em quando, podes muito bem permitir aos pobres coitados.

- Besteiras aqui, besteiras lá, besteiras por todo lado - disse Nosso Senhor - mas agora vou terminar com este eterno blá-blá-bá. Acho que vou racionar um pouco as palavras. 

- Então faz o favor de te limitar aos teus homens - atalhou a mulher de Nosso Senhor -. Não te mete com minhas colegas, lembra-te bem disto. 

- Não vamos brigar por uma coisinha destas - disse Nosso Senhor, conciliante -. Se todos os homens se tornam um pouco mais silenciosos, a coisa já melhora. 

Nosso Senhor sentou-se e pensou: "Não será agora que vou ser parcimonioso, mas, pelo contrário, fartamente generoso. Vou dar-lhes dez mil palavras por dia, isto certamente lhes será suficiente. Vejamos... isto dá três milhões e seiscentas e cinqüenta mil palavras ao ano... acho que posso deixar de lado um acréscimo extra para os anos bissextos, este dia eles podem muito bem calar a boca em nome da paz... e assim em 78 anos teremos... bem, se ofereço a cada um cem milhões de palavras, contadas desde o nascimento, eles têm em todo caso uma boa margem para conversa fiada".

Nosso Senhor expediu uma circular com este conteúdo a todos os seres humanos do sexo masculino. Comunicava ainda que cada ocasião que alguém ultrapassasse a cifra exata de um milhão de palavras, soaria uma pequena campainha no ouvido do próprio. E quando a provisão de palavras estivesse quase esgotada e restassem apenas dez palavras, a campainha emitiria sinais curtos durante um minuto. 

Nosso Senhor calculara certo, como sempre. A consciência de que a provisão de palavras era racionada fez com que muitos dos mais loquazes senhores na terra se pusessem a pensar um pouco mais cada vez que soava a campainha. Talvez eu tenha falado demais, pensavam. Talvez eu deva pensar um pouco mais e falar um pouco menos. E assim pensavam um pouco antes de continuar a falar. Para suas alegrias, observaram que suas conversas dali por diante se tornaram mais coerentes e interessantes de serem ouvidas, e tiveram grande sucesso na vida graças à sábia decisão de Nosso Senhor. Até aqui, apenas três pessoas deram cabo de suas cem milhões de palavras. 

O primeiro foi um sacerdote que durante muitos anos de serviço desfiava as escrituras em tão longas prédicas que a campainha lhe tilintava freqüentemente no ouvido. Ele no entanto não se preocupava muito com aqueles avisos da campainha, pois achava que na condição de servidor de Nosso Senhor, certamente teria direito a uma reserva extra de palavras caso sua quota chegasse ao fim. 

Um dia, justo quando havia começado sua prédica dominical, ouviu os curtos e insistentes sinais que significavam que agora ele tinha apenas dez palavras. Mas nem ligou para isso. "O chefe certamente me fornecerá um acréscimo extra, bom como ele é", pensou despreocupadamente. 

Encontrava-se em meio a um raciocínio que começara com a caminhada de Jesus sobre as águas e continuava com uma comparação entre o passeio divino e o comportamento ímpio que dão prova muitos escravos do pecado em nossos tempos dissolutos ao banharem-se embriagados e nus, à noite, nos chafarizes em frente a nossos museus e instituições de cultura. E continuou como se nada tivesse acontecido em seus ouvidos: 

- Objetará então o pecador: não é pecado gozar a vida. 

Um silêncio divino inundou a igreja. Os paroquianos despertaram surpresos de suas semi-sonolências. Terminaria a prédica com estas palavras? Sim, pelo jeito, pois o pastor mantinha o rosto entre as mãos e nada mais dizia. Após alguns instantes, um órgão perplexo começou a soar. 

Naquele dia todos chegaram alegres da missa em bom tempo para escutar programas da velha guarda, fortalecidos na alma pelas palavras finais do pastor que diziam não ser pecado gozar a vida. 

- Foi uma prédica extraordinariamente linda - diziam os paroquianos um para o outro, e ninguém entendeu porque depois daquele domingo o pastor foi conduzido para um silencioso serviço na secretaria da paróquia. 

O segundo pela ordem a ser atingido pelo racionamento de palavras foi um relações-públicas do ramo de detergentes. Sua profissão consistia em ser excepcionalmente gentil, da manhã à noite, e em especial durante o almoço e a janta, com todas as pessoas que sua firma entrava em contato. Então vocês podem imaginar que o relações-públicas conhecia todas as histórias engraçadas sobre detergentes que existiam e mais algumas ainda, e além disso dominava a arte de sorrir todo o tempo com seus dentes alvíssimos enquanto falava, de forma que as pessoas ficavam loucas por ele e por seus detergentes. 

- Cada vez que eu abro a boca, um par de meias é jogado em nosso detergente em alguma parte do mundo - costumava dizer com seu sorriso irresistível e, como isto havia sido calculado pelo departamento de estatística de sua firma, era indubitavelmente verdade. 

Para um tal relações-públicas, a campainha evidentemente soava com freqüência. Após cada sinal ele ficava algo pensativo e naquele dia não tomava nenhum Dry Martini, pois Dry Martini lhe soltava de tal modo a língua que lindas palavras e lindos slogans lhe fluíam da boca sorridente como um lindo rio onde as associações de donas-de-casa e revendedores se afogavam prazerosamente. 

Quando soaram os últimos e repetidos sinais curtos em seus ouvidos ele estava almoçando, por custa de sua firma, com uma delegação do Instituto de Pesquisas Domésticas. Já havia tomado seu Dry Martini aquele dia, e antes de perceber exatamente que soara o último sinal, deixou escapar: 

- Apanhem o detergente que quiserem e comparem-no ao nosso. 

Então controlou-se. Por Deus, a campainha das dez palavras. E nove já haviam sido ditas! Uma única palavra, pensou ele, uma única! 

Enfiou a mão no elegante bolso de seu casaco e apanhou um pacotinho com o deteergente de sua firma, que sempre carregava consigo. Despejou uma dose mortal do detergente em sua taça de vinho, ergueu com seu sorriso alvíssimo a taça ante os encantados delegados do Instituto de Pesquisas Domésticas e disse: 

- Delicioso. 

Bebeu e caiu, elegantemente morto. Pois um relações-públicas não pode viver sem a possibilidade de dizer sem cessar coisas lindas. 

Naturalmente agora vocês se perguntam quem foi o terceiro homem a dar cabo de suas cem milhões de palavras. Pois bem, vou dizer-lhes, foi um político. Ele desenrolava textos e conversava fiado e lançava acusações e sofismava e esbravejava tanto que antes mesmo de ter chegado aos cinqüenta a campainha já havia soado em seus ouvidos noventa e nove vezes. E agora se aproximavam as eleições e nosso político sentou-se em uma mesa em companhia de seus adversários e de um apresentador, para um debate na TV. 

O político do qual falo olhava fixamente para a câmara e disse no seu minuciosamente ocupado espaço onze mil quinhentas e sessenta e três palavras, entre as quais podemos escolher, ao azar: segurança, todos, aposentadoria, vocês mentem, padrão de vida, conspiração, eleitores querem saber, aposentadoria, besteiras, 1956, orçamento, homens do povo, grupos de baixo salário, confiança e aposentadoria. 

Ao chegar ao apelo final soaram os pequenos sinais curtos nos ouvidos daquele político. Ficou tão estupefato que disse espontaneamente a todo mundo: 

- Já disse tantas bobagens que agora eu calo a boca. 

Graças a este apelo final aquele político foi escolhido para ministro e governou por muitos anos. Como não podia mais dedicar-se a cacetear os eleitores com conversa fiada, dispunha então do dia inteiro para pensar um pouco e executar uma série de medidas, de modo que se tornou um dos melhores ministro de Estado que este país teve, como consta nos Anais do Partido. E se não estivesse morto, estaria governando ainda. 

Enquanto vocês lêem isto, Nosso Senhor fez um levantamento para sua mulher do resultado de seu grande racionamento de palavras. 

Podes notar que tudo ficou significativamente mais silencioso agora, Elvira - disse ele -. Seria agora o caso de pensarmos em estender as determinações de racionamento inclusive ao campo das mulheres, não achas? Hás de convir, tu que falas a todo instante de emancipação e dessa papagaiada toda. (Lá no fundo, Nosso Senhor pensou que seria melhor se inclusive sua mulher fosse submetida ao racionamento, mas evidentemente nem tocou no assunto). 

- Emancipação aqui, emancipação acolá - disse a mulher de Nosso Senhor -. Mas um racionamento desses para mulheres tu só vais estabelecer em cima de meu cadáver, Karl-Ragnar. 

E o fato é que a mulher de Nosso Senhor nunca morre. Esta é a sorte de vocês, adoráveis tagarelas. Por: Janer Cristaldo

terça-feira, 22 de janeiro de 2013

HOMENS QUE NÃO BANCAM

Em dias de preguiça de verão, vi um filme desses de cujo nome ninguém se lembra. Férias devem ser assim: nada fazer e quando fizer, fazer nada.


Mede-se a liberdade de uma pessoa pela capacidade que ela tem de fazer nada nas férias sem sentir aquele apelo de classe média de "fazer algo nas férias".

Mas eis que um filme me chamou atenção pela temática: o problema que é quando o homem vive sustentado pela mulher.

O personagem em questão pergunta para uma advogada que o está defendendo num caso: por que homens aos montes sustentam financeiramente mulheres, e o contrário é visto com maus olhos?

A questão é que homens que pegam dinheiro de mulher são vistos como maus-caracteres. E ponto final. Não seria esse mais um preconceito que deveríamos combater, assim como achar que os ratinhos não têm alma?

Antes de tudo, devo avisar às sargentas de plantão de que pouco importa que estatísticas apontem muitos casos de mulheres que sustentam famílias nas classes C e D (normalmente são mães sozinhas).

Quando eu era estudante de medicina na Universidade Federal da Bahia e dava plantão em cidades paupérrimas no interior do Estado, atendia quatro mulheres ao mesmo tempo (aquele tipo de experiência que a esquerdinha dos jantares inteligentes paulistanos morreria de medo de ter, mas mente dizendo que se importa com o sofrimento no mundo). Mulheres assim se apresentavam como "largadas de marido".

Tampouco os "inteligentezinhos" devem perder seu tempo falando que seu terapeuta corporal vive muito bem cozinhando para a esposa médica na casa deles em Cotia.

A questão do personagem merece atenção para além das modinhas. Homens assim são chamados "homens que tiram dinheiro de mulher". A questão é: por que ainda hoje homens assim são malvistos? Por que se olha para eles com suspeita de que sejam maus-caracteres?

Claro que existem exceções, isto é, casais que vivem bem com arranjos assim; mas o fato é que esses arranjos costumam ter prazo de validade curto. E muitas brigas versam sobre essa "situação".

Esse normalmente é aquele tipo de tema sobre o qual não se fala em famílias educadas ou entre pessoas que fingem que o mundo mudou depois dos anos 1960. Este tipo então é muito engraçado.

A verdade é que, mesmo que bem-sucedidas, mulheres que sustentam seus parceiros sentem, no silêncio do cotidiano, ou na agonia de ter que pagar as contas no final mês, um gosto amargo de solidão na boca. Seria idiota imaginar um homem que sustenta sua mulher sofrer por se sentir "só" na função de provedor da família. Por que as mulheres se sentem sozinhas nessa situação, e os homens não?

Mas nossa heroína se pergunta: será que eu não mereço mais? Por que justo eu não consigo que meu parceiro me "banque"?

O mais duro é que mesmo em casos comuns nos quais os casais dividem os gastos, essas mulheres, que dividem os gastos, também "invejam" aquelas que têm maridos que "bancam".

Há casos em que mesmo que elas não precisem, gostariam de ter maridos que "banquem". Eis o príncipe eterno. Todas o querem.

Aliás, o verbo "bancar" (e sua ambiguidade entre "sustentar", "enfrentar situações difíceis" e o substantivo "banco", lugar de dinheiro) vem muito a calhar.

É comum dizer que, em casos nos quais a mulher tem muita grana, isso nunca é um problema. Acho que sim, mas nem tanto. Se ele não a banca financeiramente, porque ela de fato não precisa, ele terá que bancá-la em outro lugar. A mulher sempre quer "ser bancada".

O incômodo feminino com homens "que não bancam" parece passar não só pela falta de grana (essa é apenas a mais universal das referências), mas essencialmente pelo problema do homem que "não tem atitude". "Ele podia pelo menos se mexer...", diria nossa heroína. Logo ela perderá o respeito por ele. Seria a causa biológica ou cultural?

Se a mulher séria tem de provar que não dá por aí, o homem sério tem de provar que não quer pegar dinheiro de mulher. Eis dois limites do blá-blá-blá contemporâneo.

Mesmo que façam pose de bem resolvidas bancando seus homens, essas mulheres sofrem com isso e estão mentindo. Por: Luiz Felipe Pondé Folha de SP